Rúben de Carvalho acompanhou-me com a sua sabedoria e cultura, através da rádio.
Ouvi-o muitas vezes, na Antena 1, com Iolanda Ferreira, apresentando, divertidos, as "Crónicas da Idade Mídia", uma hora semanal de excelência, viajando por épocas e geografias, sendo a música contemporânea o pretexto para a conversa e a partilha. As noites de segunda para terça nunca mais serão assim, empolgantes. Estranhei, quando na semana passada repetiram uma edição antiga do programa, sobre as marchas populares de Lisboa…
A sua forma de comunicar era cativante, quando ao lado de Nogueira Pinto dava alma aos "Radicais Livres", deixando sonoras gargalhadas no éter, dando largas a um sentido de humor que o distinguia.
Rui Pego, tal como David Ferreira foram comoventes, celebrando a genialidade deste ser humano que se transcendeu, ao enfrentar as diversas prisões que o fascismo lhe montou, pelos seus ideais, ou na criação de grandes eventos em tempo de Liberdade, como a Festa do Avante.
Há pessoas que ao longo da sua caminhada e pela qualidade da escala humana dos seus gestos são a essência da Poesia.
Este domingo escutei o Ricardo Rocha dedilhando a guitarra cuja genialidade herdou do avô e um trecho sinfónico baseado na Carvalhesa, durante o funeral deste homem que um dia me telefonou para felicitar a revista da Aldraba - Associação do Espaço e Património Popular, por incluir um testemunho sobre a vida no bairro da Musgueira, artigo esse escrito por Manuel José Graça da Silva. Para Rúben, depoimentos como aquele podiam ajudar bastante os responsáveis das autarquias com o pelouro da Intervenção Social, nas intervenções de realojamento, pois era um olhar por dentro e não o registo de técnicos, geralmente distanciado.
Conheci-o com esta diferença de atitudes e pensamento.
Rúben foi alguém que passou neste Mundo com a sensibilidade dos sonhadores, entre a magia da criação e a crueza do quotidiano, interpelando-nos com a subtileza da árvore que todas as primaveras floresce de novo e as asas das palavras mais fraternas, que iluminam a caminhada. Melómano e musicólogo, os seus conhecimentos eram vastos. Mas o intelectual procurava não se distanciar do território popular, junto do qual foi recolhendo profunda informação sobre o Fado, a par das fontes eruditas.
Estive no cemitério do Alto de São João para abraçar a Madalena Santos e homenagear uma Vida que inventou um pouco do perfume de paraíso, fruído nesta terra, lembrando-nos todavia que para o sentirmos é preciso lutar, lutar sempre!
De luta se fez a sua existência, ajudando a construir o futuro, acreditando que é possível viver melhor!
Obrigado Rúben, pelo fantástico fôlego e pela incansável persistência que nos ensinaste!
Luís Filipe Maçarico (texto) Fotografia recolhida na página da Antena 1.
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