"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

domingo, março 19, 2017

O voo do Maçarico rumo à Paz

José Joaquim Maçarico era meu pai.
Partiu, soube-o agora.
Hesitei em escrever acerca deste assunto, pois é do foro íntimo e nos dias de hoje as pessoas partilham tudo na Internet, tanta coisa cuja intimidade deveriam resguardar...
Independentemente da parte do percurso que me afecta e do qual não falarei aqui, pois não sou juíz de ninguém, deixo suspensa uma pergunta que me perturba: Porque teve de ser assim o nosso (não) relacionamento?
Aparte isso, terei de relevar o facto deste ser - cuja perda se assinala - ter sido, apesar da sua dificuldade em expressar emoções, sentimentos...associativista, de longa data.
Foi Presidente da direcção da Sociedade Promotora (Lisboa, freguesia de Alcântara) e em representação desta, Presidente da antiga Federação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio, sita na Rua da Palma, homenageado em sessão solene desta instituição, aquando dos 75 anos da FPCCR, curiosamente quando eu pertencia aos Corpos Sociais (era secretário da direcção presidida por Alfredo Flores).
Que o seu espírito repouse em paz, é o que desejo.

Luís Filipe Maçarico (texto) Fotografia recolhida na Web.

quinta-feira, março 16, 2017

Estereótipos que a realidade ultrapassou, na revista à portuguesa e no cante alentejano


A Lisboa actual - que uma parte das pessoas teima em não ver, gritando, como resposta aos que apontam os perigos da turistificação, existindo uma espécie de DisneyLisbonlandia - o seu amor à cidade, onde nasceu, cresceu, amou, etc., é para os mais atentos um cenário, uma montra de vazio, onde é possível recuperar prédios, para transformá-los em alojamento local, hostéis, hotéis e condomínios de luxo, empurrando os pobres para fora do centro. Ou seja: matando a identidade de moradores que criaram uma forma genuína de existir...
Dizem que Alfama perdeu metade da população... lemos, ouvimos e vemos...

No telejornal da RTP, há duas semanas, uma senhora que vai perder a sua residência, na Mouraria, juntamente com mais de uma dezena de moradores, num edifício comprado por empresa que fez ultimato aos habitantes idosos, comentava mais ao menos assim: "Se é o povo que faz os santos populares e as marchas, daqui a uns anos serão os estrangeiros a desfilar na avenida, em nome deste bairro?"

O próprio presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, em recente entrevista ao "Diário de Notícias", repetiu o que há alguns meses alguém escreveu, em alerta, num periódico: "Estão a matar a galinha dos ovos de ouro!"
A sangria de habitantes (votantes) obrigou os autarcas e os candidatos de diversos partidos a mudarem de registo. Vozes que hoje se inflamam contra a injustiça, estiveram a dormir há uns tempos atrás...quando já era bem visível esta mudança - violenta - sobre o povo dos bairros históricos.

Contudo, nas revistas à portuguesa, esta realidade não surge nas críticas à governança da cidade e do país...salvo raras excepções que podem até existir mas desconheço.
As revistas sempre tiveram essa coragem de desancar, em linguagem dúplice, metafórica, os figurões da política, patronos de regras que "não lembram ao careca"...

Continuamos escutando melodias, que celebram Lisboa, navegando em estereótipos, onde abundam as míticas referências às varinas, que já não encontramos nas ruas (as últimas estão reformadas e baralhadas da memória) e de profissões e lugares evaporados, na voragem de um tempo avassalador onde tudo se reinventou, da casa do tradicional pastel de bacalhau com queijo da serra ao mundo fabuloso da sardinha portuguesa, numa estética kitsh para indrominar turistas, vistos como fonte de receita estupidificada, que na sua ignorância compram o falso pelo verdadeiro....
E nada disto é ridicularizado nos textos declamados por profissionais e amadores de teatro, que estou certo dariam sketches bem divertidos, pelos equívocos que tais situações geram.

O mesmo se passa no Alentejo e numa das suas artes, elevada a património imaterial da humanidade...para lá dos múltiplos aproveitamentos, que podem desvirtuar o que é genuíno...
Algum cante alentejano continua a exaltar o mito salazarista do "celeiro da nação", porém a realidade é que hoje não são os trigais que inundam o território, mas oliveiras de curta duração e produção intensa, que como o "Público" de ontem noticiava, metade do olival e três quartos do amendoal do Alqueva,  estão nas mãos de espanhóis.

Não quero com isto dizer que os autores das modas façam a actualização dos versos, mas que pelo menos os grupos pudessem cantar o que é eterno: a terra, os homens e os bichos, para glosar o título de um maravilhoso livro de João Mário Caldeira, escritor maior da margem esquerda, deixando de lado o que está datado, o que é passado, mais ideológico e menos etnográfico.

O vinho é outra das produções para exportação, todavia quase todos os poetas não referem estas realidades e continuam falando dos estigmas que atingiram gerações envelhecidas, que importa guardar na memória colectiva. Mas o Alentejo é um espaço desmedido de inspiração e tudo está em mudança...
Os portugueses deveriam ir ao psiquiatra, para saírem da ficção onde estão petrificados, atrevendo-se a representar, cantar e escrever mais sobre o quotidiano que se desenrola à sua volta...


Luís Filipe Maçarico (texto) Imagens recolhidas na Internet

terça-feira, março 07, 2017

Cais do Ginjal Revisitado

Esta tarde, caminhei pelo Cais do Ginjal, onde já não andava desde que fiz um artigo sobre aldrabas e batentes nas portas da cidade antiga, para a revista "Anais de Almada", dirigida pelo Professor Alexandre Flores, que não tornou a sair.
 
A degradação, o perigo de desabamento das ruínas que restam (fachadas de armazéns e de espaços residenciais) aconselhariam uma intervenção, para proteger os caminhantes (vi algumas dezenas de turistas, que no "Atira-te ao Rio" têm um suposto "oásis", estando a rocha e a terra esbarrondadas, encobertas por trepadeiras...
Perto, as escadinhas que vêm da Boca do Vento estão vedadas e a falésia tem uma rede para proteger os incautos...

Sendo um dos sítios de onde se desfruta uma paisagem única, sobre o Tejo e o belo cenário de filme, em que Lisboa se está a transformar, espero que num futuro próximo haja - a partir da margem sul - iniciativas que contrariem a burocracia e a especulação (dois entraves à harmoniosa ressurreição) e ainda possa assistir a um passeio à beira - rio, que sem pôr em causa a escala humana, nos surpreenda pela positiva.

O Jardim do Rio, o elevador panorâmico e o Museu Naval são três projectos realizados, que merecem ter continuidade, com novas ideias marcantes que valorizem o património, nomeadamente os engenhos (aqui mostrados) de uma azáfama esvaída, contribuindo para partilhar a memória do que foi o Cais do Ginjal, no século XX, ligando-o a heróis populares como o boxeur Santa Camarão e o também desportista e escritor Romeu Correia.

Luís Filipe Maçarico (texto e fotografias)

domingo, março 05, 2017

"Lisboa Levada da Breca" nova revista de teatro nos "Combatentes"

Estreou-se no Grupo Dramático e Escolar "Os Combatentes", Rua do Possolo, nº 5 a 9, a revista "Lisboa Levada da Breca", encenada por João Simões, responsável pelo "Anzol Castiço", o qual felicito pelas muitas gargalhadas que o texto de Nuno Lopes, representado por um grupo de jovens actores despoletou. Grupo de gente nova, onde se destaca o talentoso João Camões, que parabenizo. Ele é inesquecível na evocação de Solnado, irresistível caricaturando Marcelo Rebelo de Sousa, na sua presidência dos afectos e das selfies. E como não podia ...deixar de ser, lá estão os concursos e os programas televisivos estupidificantes...Há muito que não me divertia tanto.!!!

Em Março, eles voltam nos dias 11, 17 e 25. Em Abril, nos dias 8, 21 e 25. E em Maio, nos dias 6, 21 e 20.


O património da revista à portuguesa enriqueceu-se com este maravilhoso contributo. Grandes Amadores de Teatro, são todos os que pertencem à equipa, no palco e nos bastidores... É preciso ter mesmo um imenso amor, para se produzir um tão divertido e inteligente conjunto de números.

Aplaudo com entusiasmo a opção, quer do autor do guião quer do encenador - sem ambiguidades nem meias tintas. São criticados e gozados alguns dos figurões da vida política e mundana, que o espírito crítico e livre proporciona, sem concessões...

Recomendo a todos os que possam ir ao Teatro desta colectividade, que não percam o exercício hilariante e com qualidade, que estas pessoas muito novas criaram e partilham, durante uma série de fins de semana e feriado(s), para um público popular, que em alguns casos apenas tem acesso a estes espectáculos nas colectividades.

Parabéns a Bruna Silva, Diogo Consciência, João Silva, Marta Pina, Miguel Carvalho, Joana Moreira (actores). E ainda a Cristiana Canaveira, Inês Martins, Mónica Caldeira, Rebecca Gonçalves e Sandra Fernandes (ballet), Rui Vaz (letras e direcção musical) Luís Mercês (cantor e  orquestração), Bruno Paredes (coreografia), Professores e Alunos do Curso de Artes Visuais do Agrupamento de Escolas Braamcamp Freire (Cenografia), Pedro Leitão (design), Zezinha Pereira, Ricardo Jorge e Rafael d'Almeida (Guarda-Roupa), Inês Moreira (Apoio de Camarim) Cláudio Mendes, David Alves, Edson Iè, Miguel Vasconcelos e Rúben Peixoto (Técnicos de luz e som) pelo resultado conseguido!

Parabéns à direcção do Grupo Dramático e Escolar "Os Combatentes", que em 30 de Setembro completa 111 anos e cujo jovem Presidente Tiago Mendes, apenas com 26 anos, fez uma aposta vitoriosa, confiando ao "Anzol Castiço" o palco onde Aida Baptista e Maria Clara iniciaram os seus percursos artísticos.

Luís Filipe Maçarico (texto e fotografias)