"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

quarta-feira, fevereiro 24, 2016

DA IMAGÉTICA INAUDITA À MESTRIA DESUSADA


 
Esta quinta feira pelas 18:30h, na Galeria Municipal da Amadora é inaugurada a exposição "INQUIETUDE" de Rodrigo Dias, da qual o pintor fez questão que eu fosse Curador. Participarão na breve sessão poética, além do autor e do Curador, as poetisas Cristina Pombinho e Paula Silva,e ainda o actor Luís Luis Castanheira, membro do Coro do Teatro Nacional de São Carlos. 
Apareçam! Rua Luís de Camões, Casa Aprígio Gomes, Amadora. Eis o texto que escrevi para o Catálogo:

DA IMAGÉTICA INAUDITA À MESTRIA DESUSADA
 
(Reflexões acerca do percurso do Pintor Rodrigo Dias)
Rodrigo Dias é um Pintor, para quem a existência é uma imensa tela, que se prolonga na pele, nas paredes, nos gestos, na luta constante pela cintilação, mas também pelo seu contrário.
Entrar no seu espaço, na lógica do seu percurso enriquecedor - com inúmeras facetas, ora experimentalista, ora imbuído do traço clássico, é mergulhar numa teia de sensações, espantos, renascimentos.
Que despertam o voo do verbo, emoções…
A sua jornada foi vincada a ferro e fogo.
O quotidiano transcendeu-se.
A incompreensão outorgou-lhe asas.
O seu refúgio teve sempre a escala do inesperado e do desmedido.
Cada representação pictórica ou desenho condensam um tempo, que foi de lágrimas e suores sublimados num silêncio ruidoso, insuportável, desalinhado.
Influências, teve-as, - e podemos evocar Moebius ou Artur Bual, cujo atelier frequentou com regularidade, sendo Amigo do Fecundo Criador - mas o trajecto ganhou a forte pegada da sua criatividade, da singularidade de um processo, que para ter verdade exorcizou muita entrega e autonomia onírica.
Aparte as ocupações profissionais, de onde, enquanto mortal comum, retira o sustento, este Artista sente a liberdade de uma loucura próxima, nas formas e tons, transformando o quadro no ringue, onde luta com o mundo interior.
Por muito que as palavras busquem explicar a técnica e a imagética dos seus cenários e máscaras, é a observação do público mais atento, que melhor pode sentir a obra de Rodrigo Dias.
Procurando vivenciar os dias da criação - pincéis, tintas e telas, num diálogo tenso, reproduzindo rostos, pedaços de vidas anónimas, que marcam a caminhada colectiva, retratos de fantasmas, que tentam dizer algo sobre a alucinação dos momentos, A pintura de Rodrigo Dias é um retrato do nosso tempo, de perda constante, de paraísos obscuros, que tanto custam a descobrir, da pureza escondida, da subversão de respirar sonhos…
Entramos nas telas com a sensibilidade, procuramos no labirinto a luz que faz falta, para acreditar em algo, nem que seja no retorno do cosmos.
Rodrigo Dias semeia incansavelmente. Colhe o ouro do seu insaciável labor.
Saboreemos estes frutos invulgares, que o olhar tem de saber ver.
Universos paralelos, presentes na nossa digressão.
Admiramos esta linguagem divergente, que reproduz uma matriz desusada através da qual comunica Pintura, sem concessões.
O futuro deste Artífice vai levá-lo a um plano esplendoroso, que o fixará na História da Arte, pela originalidade criativa, pela inspiração cromática, pela proposta que revoluciona o que conhecemos, auto - renovando-se em cada dia, permanecendo numa Beleza sem Limites, que apenas os Mestres alcançam.
 
Luís Filipe Maçarico
Antropólogo; Poeta
Lisboa, 7 de Janeiro de 2016

segunda-feira, fevereiro 01, 2016

Um Poema Imortal de Eduardo Olímpio




SE FORES AO ALENTEJO...


Se fores ao Alentejo
Não leves vinho nem pão :
Leva o coração aberto,
E ao lado do coração
Leva a rosa da justiça
E o teu filho pela mão.

Se fores ao Alentejo
Não leves vinho nem pão :
Leva o teu braço liberto
Para abraçar teu irmão;
Esse irmão que está tão perto
Do teu aperto de mão
E que tão longe amanhece
Nos campos da solidão.

Se fores ao Alentejo
Não leves vinho nem pão :
Leva a alegria de seres
Irmão de quem vai parir
Uma seara de trigo,
Uma charneca a florir,
Um rebanho e um abrigo
E um amanhã que há-de vir
Como se fosse outro amigo
Dentro do sol, a sorrir.

Se fores ao Alentejo
Não leves vinho nem pão :
Leva o coração aberto
E o teu filho pela mão.

Poema (Eduardo Olímpio) Foto (LFM- entre Alandroal e Terena)
Eduardo Olímpio é natural de Alvalade do Sado, vila do concelho de Santiago do Cacém, onde nasceu a 24 de Janeiro de 1933, tendo completado recentemente 83 anos.