"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

quarta-feira, dezembro 22, 2004

As portas


Que as portas de 2005 se abram para o sonho e para a paz. Que os batentes não precisem de ser ruidosos para escancarar os corações e a energia de cada um poderem encaminhar-se no sentido da fraternidade e da ternura...
Mas em que planeta será possível a concretização deste desejo?(foto de Vanda Oliveira) Posted by Hello

O Importante é remar...

No meu bairro, durante o estado de sítio em que Lisboa ficou no distante 25 de Novembro de 1975, a malta cantava : "O que é preciso é remar/ Pr'á canoa não virar".Foi há tanto tempo e mantém-se tão actual.Estes versos fazem-me aliás lembrar Bertolt Brecht, quando escreveu "Quem ainda está vivo não diga nunca/O que é seguro não é seguro/As coisas não continuarão a ser como são/Depois de falarem os dominantes/Falarão os dominados"
Inch'Allah, dizem os meus amigos de Tozeur e de Jerba, gente como nós de quem tenho saudades.
Pelo sonho é que vamos,afirmou Sebastião da Gama e Gedeão assegurou que o sonho comanda a vida.
Neste virar de página,saibamos esperar, tal como Eugénio de Andrade escreveu,a sabedoria. Isto vai meus amigos, isto vai- dizia Ary. Os poetas são profetas da claridade.Tem de haver um futuro para a Luz!!!

terça-feira, dezembro 21, 2004

Ecos de Quatro Leitores

Torno uma vez mais aos leitores que não sabem ou não conseguem colocar comentários no blog, mas que me escrevem para o email dizendo o que pensam. Sem delongas, as palavras desses leitores e votos de um Ano 2005 muito melhor para todos aqueles que visitam o "Águas do Sul":
1) Caro Luís: Acabei há momentos de de ler o teu blog (já tinha feito duas tentativas, mas sem sucesso)e quiz de imediato dar-te os parabéns. Está lá o Luís que eu conheço. Este teu alinhamento nestas novas ferramentas foi igualmente uma agradável surpresa para mim. Posso dizer-te que nessa matéria estou uns passos atrás de ti. Um abraço. José Luís (Leiria)
2) Olá há quanto tempo eu não ouvia falar de "tramelas". O termo trinqueta ou trincheta não me lembro de ter ouvido alguma vez. Trinqueta deve ter a ver com trinco? Este eu ouvi muitas vezes e ainda se usa lá na aldeia. Quando alguém batia à porta, ouvia-se de dentro: Entre, está só (fechada) no trinco ... Obrigada por me trazeres estas memórias. Bj MEugénia (Lisboa/Sobral da Adiça)
3) Gostei imenso de ler este seu blog.Eu como mais velho rambém de lembro de alguns desses programas, alguns dos quais ouvi, mas nada comparável. Não haja dúvida que o Luis é diferente da maior parte das pessoas, para melhor, não só pelos seus conhecimentos, mas pela maneira como enfrenta a vida e a frontalidade que sempre tem nas reacções quando confrontado com os problemas. Desejo-lhe muita saúde. Homens assim fazem falta. Deviamos todos ter mais coragem e agir como o Luis. Um abraço Joaquim Avó (Almada)
4) Eu até visito o blog, mas não sei comentar. E agora que ele está cada vez mais interessante: com chifres, burros...A minha visão não cientifica dos chifres: o par superior tem linhas direitas e mais austeras é masculino, o debaixo está colocado sob a protecção e sobre a impetuosidade do masculino tem formas arredondadas formando um coração: é fêmea. Mas ambos têm formas artísiticas, a cornada é muito requintada (...)
Adoro esta fotografia do Jorge Cabral já a conhecia (...)Adoro a fotog... porque ela me transmite o olhar de aceitação e sonho das crianças arabes
Estou com a assoc. das Aldrabas - presentes no 1º poema do meu livro " o meu Amor é Arabe". (...)sei aprecia-las, preservá-las...gosto de lhes tocar, são sinal de segurança, privacidade, autenticidade. Nasci numa casa que as tinha. Usei-as, embora novas, no monte há doze anos atrás. E o meu amor será eternamente arabe... terá mil e uma aldrabas nas portas do seu palácio de areia.
Maria José Lascas Fernandes (Vagos/Lavre)
A todos um grande Bem Hajam e Bom Ano 2005!

Alexandre Laboreiro adere à "Aldraba"


Foi com muita satisfação que recebemos deste professor e amigo de Montemor-o-Novo a vontade de adesão à Associação "A Aldraba".Homem interveniente, autor de artigos de opinião na imprensa local que nos remetem para uma reflexão pertinente acerca da cultura e da cidadania, agrada-nos sobremaneira partilhar esta honrosa adesão. (Foto de Vanda Oliveira) Posted by Hello

segunda-feira, dezembro 20, 2004

Um Olhar por Dentro ou Um Bairro Desaparecido-III

Conflitos e guerras entre vizinhos, sempre existiram, nem mais, nem menos que nos outros bairros mais espelhados que este, mas as pazes faziam-se seguramente de outra maneira, rápida e com uma resolução insólita. Numa festa, baile, na praça, à sueca, na tasca do Gordo, na sede do bairro a ver um jogo de bola e mesmo a reparar um cano de água, antena, máquinas de lavar roupa, raríssimas nestes locais, assim como técnicos. Com uma união e entreajuda para tentar resolver qualquer problema que aparecesse, havia sempre alguém que conhecia um vizinho e este outro que conhecia a pessoa indicada para fazer a reparação. Não se pagava favores, comia-se em família com todos os actores e mais alguns que ficariam convidados de ultima hora, enfeitiçados pelo cheiro e da alegria contagiante destas festas improvisadas, à custa de uma avaria ou remodelação da casa do bairro, onde os participantes conseguiam esquecer alguns preconceitos, relacionados com as dificuldades de mercado alimentar, ficando assim contentes de ter contribuído para uma causa, que traria outra beleza à rua e fortificava a amizade. 30/08/04
Manuel José Graça da Silva
NOTA FINAL
Completa-se aqui o conjunto de textos que o Mané teve a amabilidade de me enviar e o entusiasmo de escrever-parece que não voltou a passar para o papel a lembrança desses dias remotos. O trabalho, os estudos (curso nocturno), a aprendizagem da condução, os petiscos, o convívio com amigos e a nova família, parece que o têm impedido de avançar mais umas páginas nestas memórias...De qualquer maneira, os textos ficam para a vossa apreciação. Deêm opiniões, que estes momentos revividos pelo Mané merecem uma atenção particular por integrarem um olhar por dentro de um bairro degradado, que deu lugar a um bairro novo de gente com algum dinheiro ou posição social para comprar casas bonitas.
LFM

domingo, dezembro 19, 2004

Dois textos do Mané sobre a Musgueira

Continuamos a divulgar as memórias que o Mané transformou em textos para falar do bairro onde morou na sua infância. Os textos datam já de março deste ano e em Novembro digitalizou-os e enviou-mos.
Reproduzo desejando a ele e a todos os meninos desse tempo menos bom que desta vez o Natal seja uma desforra de Paz e de Amor.
O DENTISTA*
Tenho saudades da Lisboa, onde os pregões e a venda ambulante, se destinavam somente à zona esquecida. Vagas lembranças de cheiros e sons que rodeavam a minha barraca, aconchegada como uma casinha de bonecas, onde é fácil tudo apanhar e aquecer. Bairro esse onde toda a gente se conhecia, não só o carteiro, o fotógrafo e o dentista que ia a casa das pessoas, que por vezes era mal tratado com gritos e nervosismo, porque o pai do paciente queixava-se que ele fazia mal ao filho, depois de ouvir os gritos de dor ou medo da criança que não temia a ida aos caracóis com o pai em terrenos escorregadios, ou na pesca, muito menos as pequenas guerras de rapazes de ruas vizinhas depois de ter jogado ao berlinde e troca de cromos raros menos correcta do que costume onde lhe davam alguns pontos negros e gesso, para além de uma dor de cabeça à mãe, pelas caminhadas ao hospital. (17/03/04)
GATOS E POMBOS
Não esqueci como aprendi a conhecer os barulhos dos gatos, através do meu telhado, não só sabia quantos eram como quase que percebia o que queriam. Aprendi sem me aperceber, tanta coisa sobre eles no dia a dia, mas foi à noite que mais aprendi sobre zoologia. O mês mais chato era realmente o do cio, pois a concorrência era muita num telhado de zinco, aquecido pelas tardes de pleno sol, não sei se acontecia com todos os meus vizinhos mas no meu telhado parecia um forrobodó. Cheguei mesmo a castigar os gatos dos quais conseguia reconhecer o miar, depois de ter passado uma noite insuportável. (18/03/04)
Tantos gatos e animais caseiros que conheci, tanta coisa que transcrevi para o meu quotidiano, numa criança que brincava com os buracos da terra, caricas, montes, palhas, pedras, capoeiras, quintais e pequenas hortas para as escondidas. Tive um gato, que lhe chamava Pantera, não porque fosse preto, mas porque caçava de noite, tinha manchas brancas, grande e gordo pela eventual caça nocturna. O meu vizinho cansou-se de perder os pombos correios e ficou à espera do responsável. Acabou por dar um destino mais triste para a minha veloz Pantera. Nunca senti pena por esta perda, pois ele era muito independente. Engraçado, dizer isto de um gato! Não era mau vizinho. Tinha uma bata azul todos os dias e um apito na boca, que percebi, era para comandar os pombos. Era caçador e coleccionava pombos correios.Talvez lhe dessem asas para imaginar voos infinitos que lhe eram impossibilitados pelas tarefas laborais e de uma vida mais difícil neste canto do mundo,com quatro filhos para sustentar, onde até mesmo a morada metia medo ás entidades patronais.
Cheguei mesmo a guardar as medalhas de caça, eram umas argolas, nunca percebi para que serviam, mas creio que é uma marca, ficava agarrada à pata do bicho, que a Pantera não achava comestível, deixando no meu pátio traseiro. (18/03/04)
Manuel José Graça da Silva
*Títulos e revisão do texto LFM

Um Bairro Estigmatizado visto por dentro

Hoje decidi dar voz àqueles que têm coisas importantes para partilhar. É o caso do Mané, amigo de longa data que há alguns meses, num caderninho de notas, começou a reproduzir memórias de um bairro que já não existe.
Era um abarracado pobre, lá para os lados da actual Alta de Lisboa, e os textos que me foi mostrando, talvez um dia possam ser desfrutados nas páginas de um livro. Considero aliás extraordinário que um rapaz desta Lisboa desaparecida tenha escrito sobre o bairro da Musgueira por dentro...
Enquanto escritor e antropólogo não tenho conhecimento de uma experiência semelhante... E como podem comprovar, esta incursão nas memórias da infância do Mané tem com um colorido, uma riqueza de pormenores e uma ternura, que vale a pena incentivá-lo a escrever esse livro!
O PEQUENO REI*
Que aventura ir às compras, ao domingo! sim Aventura, sim! porque só mais tarde pude perceber que as tendas se arrumavam com espaço sobrado das outras, que já eram habituais no local, sem saber o que nós podíamos comprar. Também analisavámos os apetites acrescidos, com a vontade da vizinhança de fazer de mais um dia, uma festa de convívio. Procurar o que comer seria então uma tarefa mais engraçada, mais para mim do que para os meus pais, como é lógico! Havia toda a espécie de animais vivos, dos quais, alguns mesmo para estimação, coisa que ignorava na altura, só o focinho mais mimado me fazia pensar duas vezes e perguntar a minha mãe. -Mãe, não são para comer, pois não? -Não filho são para guardar a casa!
Nem sequer me dava ao luxo de pensar, como é que uma coisa daquelas conseguia guardar uma casa, muito menos se devia ser guardada e para guardar de quem? Mas já ficava contente de saber que não era para comer. Era divertido andar no meio de todas aquelas tendinhas, construídas com paus, tábuas, plásticos, grades de cerveja, à espera de encontrar bichinhos e esconderijos, iluminando cada vez mais a minha curiosidade.
Certa manhã, depois de procurar no meio dos coelhos, patos e galinhas, dou de caras com um bicho, cheio de cores e em cima da bancada, como um rei, não deixando de ter papo e peneiras para isso, vaidade, força e voz. Como era bonito aquele coroado animal, no qual tive os olhos postos alguns segundos antes de tentar dar uma festinha...foi o meu mal, depois de ter sido picado fui a chorar para ao pé da minha mãe, que logo disse: -Foste logo mexer no Galo! Sabia lá eu o que era um galo muito menos a sua importância no seio de uma capoeira, como aquela feira...
Assim pedi ao meu pai que o levasse para casa para assar, deixando resolvida a situação de embaraço dos meus pais, de tentar agradar-nos.Ficou barato e resolveu-se a escolha do almoço. Mas o mais difícil veio depois. Não parava de perguntar ao meu pai: -O que vais fazer com ele? -Como é que o vais matar? Para esclarecer as dúvidas, ele dizia: -Não o querias, pois vais o ter. Acho que ele dizia isto para não ter que voltar atrás, pois são coisas mais complicadas e com muito significado para as gentes deste bairro. Não sabia aonde meter-me, comecei a ficar com pena do bicho, mas acabei por ver, aprender como se prepara um frango ou galo, pois é da mesma maneira, só varia das coisas que se podem aproveitar.Tive pena de não o conseguir comer no meio disto tudo, mas guardei este segredo comigo, sem dizer aos outros rapazes do bairro, para não ser envergonhado em publico, assim como os meus pais.
Manuel José Graça da Silva
*Título e revisão de texto de LFM

Dar Voz à Ana

A minha amiga Ana Maria Fonseca acaminhodosol.blogspot.com não consegue deixar comentários no meu blog. Tem-me enviado várias mensagens para o meu email que vou partilhar hoje connvosco e é uma forma de lhe dar a voz que não consegue ter nos "comments"...
Por exemplo: depois de ler um dos meus posts sobre a época natalícia, registou:
"Meu querido Luís: Atenta sempre ao teu blog (e continuando sem saber deixar comentários) de tudo adorei a "lembrança do presépio da tua avó' ... o pinheiro enfeitado com luzinhas e brilhos.... encantando os meus olhos deslumbrados.... o sítio mais luminoso da memória.... ( lindo...) e esse síto da memória é exactamente o meu, onde guardo o mais doce tempo de toda a minha vida, obrigada. Aquele beijo doce ANA" (domingo, 12 de dezembro de 2004 21:44:59)
E de outra vez, a Ana Fonseca, escreveu:
"Luíz Leio o teu blog sempre muito atentamente.. que bom é ler e principalmente sentir que algo está mudando em ti e retomando os tempos que me fizeram começar amar-te... "quem dera que todos os problemas da vida fossem este".... "deliciar no carrocel de nuvens"... "amaciar com falas e mimos o coração selvagem do pássáro"... depois vem...: " a natureza reduzida a um coração sem asas, é assim que vivemos na correria citadina.. este texto é para todos os pássaros impedidos de voar.... tão lindo!!!!!! Serás sempre o meu Luíz que me consegue deliciar com palavras ...agora mais do que nunca.... amo-te ... beijos doces" (segunda-feira,13 de dezembro de 2004 22:04:28)
Ainda há pouco recebi novo mail da minha amiga, que diz o seguinte:
"Luís: Decididamente não consigo fazer comentários no teu blog. Pede o nome e a password, eu digito e nada ... não percebo. Será pk eu não tenho publicado nada no meu blog??? Mas não tem nada a ver, pois não???(...) Pois a ideia era deixar-te um beijo por seres meu amigo há tantos anos... aquela anotação no teu livro é divina... Mas mais divino ainda me parece que seja TERES JÁ ENTREGUE A TESE... PUM!!! PUM!!! PUM!!! (são foguetes...) VIVA! VIVA! (fiquei tão feliz por isso).Aquele doce beijinho ANA (domingo, 19 de dezembro de 2004 13:51:43)
Um blog faz-se com os vossos estímulos: dos que o visitam e conseguem escrever um comentário, dos que como a Ana não conseguem deixar marca no corpo do blog, recorrendo ao email e até dos que visitam mas não escrevem nada e por vezes, de viva voz dizem o que pensam.
Para todos votos de um Ano Novo de 2005 muito melhor, com esperança, saúde e equilíbrio. E muita Paz.

quinta-feira, dezembro 16, 2004

O meu Poeta

Nunca esquecerei a delicadeza com que me recebeu quando naquele Verão entrei na Pensão Clara. "Este rapaz também faz versos" anunciou ele ao actual director do "Jornal do Fundão", dr. Fernando Paulouro Neves.
E surge-me muitas vezes a imagem que dele guardo, quando em plena homenagem na sua terra- Póvoa de Atalaia- ao ver-me entre a multidão me chamou para o seu lado.
Tal como recordo o momento em que numa Feira do Livro, finalmente pude conhecê-lo e lhe ofereci um postal com umas palavras repletas de claridade, que ele agradeceu.
Entrei uma vez na sua casa despojada da Rua Duque de Palmela, com a Cristina Pombinho e o poeta ofereceu-nos um cálice de Porto cuja voluptuosa cor estendeu ao sol como se quisesse brindar também ao seu amigo que tanta luz trouxe à sua poesia, poesia solar que ele me contou ter tocado os presos políticos que em tempos de trevas lutaram pela liberdade.
Tornei a entrar na casa do poeta, agora já na Calçada de Serrúbia, com a Mena Brito e com o Alfredo Flores, ela pintora, ele antigo elemento da Orquestra Gulbenkian. Falámos de cultura e do arrepio que a vida, transposta para a música, para o poema ou para a tela causa, quando está imbuída do espírito da grande arte.
Enviei-lhe poemas, livros, ele foi respondendo com poemas e estímulos.
Devo-lhe essas horas felizes.
Obrigado, Eugénio de Andrade!

Ritornello

De segunda a sexta na 2 da RDP Jorge Rodrigues realiza e apresenta um dos melhores programas da rádio portuguesa: "Ritornello". Quando chego a casa mais cedo, como hoje, delicio-me a escutar clássicos como Mozart, Rossini,Verdi, apresentados com brilho sabedoria, sensibilidade, competência e bom humor. O que é a melhor forma de preparar o jantar, longe dos noticiários de escândalos e catástrofes que a Tv vomita. Agora mesmo quando partilho estas impressões estou deliciado a acompanhar a conversa do locutor com jovens figurantes de óperas. Esta é a rádio inteligente e humana que aprecio.Numa escala de zero a vinte, tem nota máxima.

Anotação num Livro de Ruth Benedict

No meu primeiro ano da licenciatura em Antropologia tive de fazer um trabalho sobre "O Crisântemo e a Espada". Esta obra de Ruth Benedict é um olhar antropológico sobre o Japão e tal como acontece com todos os livros que compro, escrevi uma anotação, que partilho connvosco- sobretudo com a Ana Fonseca, leitora atenta desde os primeiros sinais deste blog.
"Comprado em 3-4-1991 após longa procura pelaslivrarias de Lisboa. Este foi o dia em que a Ana me telefonou de S. José onde o Nuno estava com um traumatismo craniano."
Felizmente que o Nuno e a Ana estão bem vivos e lutadores, à volta de um café onde concentram todos os seus esforços e melhores energias. Mãe e filho lançaram-se nesta aventura, oxalá o menino Jesus, o pai Natal, todos os deuses e heróis ponham no sapatinho de natal deles a melhor prenda: que a aventura tenha futuro e triunfe!

segunda-feira, dezembro 13, 2004

Selma e a Magia das Palavras


Hoje, talvez porque nao há sol, insisto em falar nas asas da criatividade,na ternura que nos pode aliviar em tempo de solidão e desatino. Lembrei-me de Selma Lagerlof, da companhia que me fez com a sua"A maravilhosa viagem de Nils Holgerson através da Suécia", livro comprado em alfarrabista, que se perdeu em mãos pouco amigas. Emprestar livros ou discos é sempre este desgosto, de ficar sem uma parte do património encantador que alimentou o nosso crescimento, quando aqueles a quem emprestamos se descuidam meses, anos, uma vida, do cumprimento de uma qualidade básica que caracteriza a amizade- o respeito pelos pertences do outro, que podem e devem ser partilhados, mas nunca usurpados.Tudo isto a propósito de um livro que me marcou pela beleza, pela riqueza de imagens, pela escrita envolvente, pela palpitação da fantasia, tão susceptível de ser tocada, tão credível...Selma Lagerlof nasceu em 1854. Em 1909 foi-lhe atribuído o Nobel da Literatura e no meu coração de menino deslumbrado com os criadores de sonhos, ganhou um lugar que ainda hoje, mesmo sem o livro amado, se mantém luminoso.Recomendo àqueles que gostam de presentear os amigos com a magia das palavras.(foto de Vanda Oliveira)  Posted by Hello

Uma Garça na Relojoaria



A precisar de pilha nova, o meu Citizen Quartz comprado há dois natais em Alpedrinha, ao sr. Marques ourives, esta manhã parou.
Na Rua Prior do Crato, a dois passos da minha casa há uma relojoaria. Quem dera que todos os problemas da vida fossem como este: muda-se a pilha e o ritmo do tempo torna ao pulso. Só que neste estabelecimento há um pormenor digno de ser contado.

Um dia, no Alentejo,uma jovem garça branca ao tentar levantar voo, não conseguiu juntar-se às demais para se deliciar no carrocel de nuvens, ao vento e ao sol do sul.
O relojoeiro de Alcântara pegou no animal, que habituado à liberdade do céu azul, foi resistindo, recusando comer, de tão triste que estava. Hoje, só aquele senhor consegue amaciar com falas e mimos o coração selvagem do pássaro.Há cinco anos que a relojoaria tem este vigilante, em cima de uma montra de relógios, bem alto, qual sentinela em sua atalaia.

Este quadro das asas impedidas de voar dentro de uma loja do tempo é algo que me impressiona.A Natureza reduzida a um coração sem asas- é assim que vivemos na correria citadina.
Este texto é para todos os pássaros impedidos de voar
(Texto e fotografia de Luís Filipe Maçarico) Posted by Hello

sábado, dezembro 11, 2004

Destoar da Quadra (Natalícia)

Desde Agosto, quando comecei a blogar, que não inseria poemas de minha autoria no "Águas do Sul"... Vá lá mais um texto, a destoar da época que atravessamos. Esta quadra tem gente bem intencionada, a querer celebrar a amizade, embora manietada pelo consumismo supérfluo.Todavia, o pior é que há uma enxurrada de indivíduos a afivelar máscaras, sorrisos postiços, carnavalescos, com música de fundo obrigatória, de sinos totalitários e anjos de pesadelo infestando os ares com as suas cantilenas demodées... E chamam a isto Natal: tempo de engorda com bolo-rei, docinhos e frituras, fretes de famílias a finjir que são unidas e televisores a vomitar guerras...
Não há nada como um poema para afirmar o sofrimento, que nos marca para sempre. Este é retirado do meu último livro("Caligrafia do Silêncio", 2004, edição de autor) apresentado no passado dia 27 de Novembro em Alpedrinha.
RITUAL

Desse longo latir
Da vida sabes tu

Para chegar aqui
Foi preciso comer merda

Não é fácil sentares-te
À mesa para arrancar
A pele...

Melancolia

À beira de mais um Natal, vieram-me à ideia os presépios da minha avó, a magia que tinham e o pinheiro enfeitado com luzinhas e brilhos, que ela também fazia, com tanto carinho, encantando os meus olhos deslumbrados. Não são precisas muitas palavras para falar destas coisas, que todos nós fomos guardando no sítio mais luminoso da memória. A memória das avós que perdemos, dos amigos que também se foram, a sensação de perda que há em cada rua iluminada, em cada sino que toca,em cada prenda que alguém insiste em oferecer, lembram os que ficaram pelo caminho: Artur, Gertrudes, Clarinha ...
Para falar deles ocorreu-me retirar do meu livro "A Secreta Colina" (Maio 2001, edição Câmara Municipal de Lisboa/Cultura) este poema, escrito em Março de 1999:
OS AMIGOS VÃO MORRENDO…

Os amigos vão morrendo
E a poesia transforma-se
No tronco sem ramos
Da oliveira carcomida
Por ventos e trovoadas.

São rios que secam,
Essas bocas sem voz.
Energias à procura
Doutra casa
Onde a manhã
Seja pássaro ou flor
De sol.

Victor

Há 31 anos no dia 11 de Setembro, prenderam-no. Quatro dias depois, no estádio de Santiago, transformado em campo de concentração, os fascistas torturaram Victor Jara até à morte.
Diz-se que os enfrentou cantando o "Venceremos".
O responsável pelo crime, que chefiava essa prisão gigantesca por onde passaram milhares de pessoas, muitas delas sem regresso para a vida, está a ser julgado.
É tempo de se sentir no Chile "El derecho de vivir/en paz!"

sexta-feira, dezembro 10, 2004

Santa Camarão, 102 anos depois


Descobri-o em Junho de 2002, quando de Ovar chegou uma carta de pessoas com uma memória que o tempo não tinha conseguido apagar, acerca deste herói do imaginário popular e do desporto portugês.Santa Camarão media 2 metros e 2 centímetros de altura e 49,5 de pés.Em cerca de uma centena de combates venceu 70%, em Portugal, Brasil e Estados Unidos. Lutou com os maiores(Max Schmeling, Primo Carnera e Max Baer). Foi actor de cinema (Amor no Ringue, filmado em Berlim, no qual a língua portuguesa foi pela primeira vez falada na 7ª Arte e "The Prizfighter and the Lady", produzido em Hollywood, com Mirna Loy )Arrastou multidões, por cá e nos States, empolgando os emigrantes lusos que viram nele um novo Viriato...
Tudo isto se passou entre 1925 e 1934. Santa nasceu em 25 de Dezembro há 102 anos e faleceu na sua terra natal, em 1968, a 5 de Abril. Tem um filho na América, o sr. Renaldo Santa, a quem aproveito para desejar um feliz Natal e um Ano Novo Bom.
Há um ano foi publicada a biografia de minha autoria "Com o Mundo nos Punhos", edição da CML/Desporto. A tese de mestrado que ultimo chama-se justamente "Os Processos de Construção de um Herói do Imaginário Popular" e é sobre esta figura fundamental do boxe português, que a maior parte das pessoas desconhece. Em próximos textos trarei aqui alguns aspectos deste atleta que os testemunhos confirmam ter sido um homem extremamente humano, pacífico e bondoso.(foto do espólio Santa Camarão/Biblioteca Municipal de Ovar) Posted by Hello

quinta-feira, dezembro 09, 2004

Tá Quase


Há meses que recuso convites para passear, conviver, petiscar, jantar...E tudo porque há uma tese de mestrado para completar. Agora que falta uma semana para a entregar, já sonho com os dias de forrobódó que tenho prometido a toda a gente para me desforrar do tempo ausente. Tá quase!... Posted by Hello

Hennessys, o outro nome do prazer


Há meses que tenho o prazer de conviver com os meus colegas de sala de trabalho neste simpático pub irlandês, cujo proprietário é um japonês da Dinamarca.Aliás este pub é um cadinho de culturas: o Tiago é filho de alentejanos, nascido em França, há caboverdianos,o Eddie que é brasileiro,uma rapariga da Letónia,além da Verinha e do Duarte,que completam o naipe do pessoal mais eficiente e simpático do Mundo - isto à hora do almoço...O chefe de cozinha e os seus ajudantes certamente que guardam um dos segredos mais preciosos que partilham de forma magistral: cozinhar com amor! Qualquer prato é uma obra de arte e uma delícia para o organismo. Depois há as irresistíveis sobremesas e eu confesso outra perdição: Um tanque como o da foto-da autoria da Vanda- de Guiness preta. Para mim, sempre que lá vou e é quase todos os dias, até porque os preços são acessíveis, o Natal dos outros soa a verdade, porque é o gozo de estar vivo e bem acompanhado. Bem hajam, Vanda, Rui, Graça, Rita, queridos coleguinhas e amigos destas horas mágicas!!! Posted by Hello

sábado, dezembro 04, 2004

Uma Receita contra o Ácido Úrico

Lembrei-me de partilhar convosco, para dizerem a quem sofre de dores tão intensas, como aquela que eu senti há anos no tornozelo (parecia que estava a ser furado por um Black & Decker), que se pode ter melhor qualidade de vida. Aliás, quem me deu a receita- o professor Alfredo Flores- garantiu que ela mete na ordem por uns tempos não só o ácido úrico como a diabetes.
Então é assim: durante 20 dias seguidos e sempre em jejum bebe-se um chá que é feito da seguinte maneira: Metem-se de molho 25 tremoços, de um dia para o outro. No dia seguinte, deita-se fora a água onde o tremoçal ficou de molho e dá-se um corte em cada um dos tremoços...vai ao lume, ferve, e bebe-se morno, podendo comer broa e misturar mel, porque é um bocadinho amargoso.
Repito: 25 tremoços cada dia durante 20 dias.
Descansa-se 5 dias.
Segunda fase: 20 dias a 20 tremoços...reparem, é tudo igual, menos o número dos tremoços: desceu para 20...
Descansar 5 dias.
Nova e última dose de chá em jejum, durante mais 20 dias...
Desta vez passa-se a 15 tremoços- e o resto já se sabe...pôr de molho, deitar a água fora, ferver em nova água depois de retalhar cada um cos tremoços...
Se fizer isto com paciência, verá -tal como eu já pude constatar- que os valores descem...ácido úrico e diabetes abrandam...
É claro que também se tem de ter cuidado com a alimentação. Mas vale a pena o sacrifício: depois até dá para fazer exibições de contorcionismo...as dores desapareceram!
Abençoados remédios caseiros, como este que a mãe do professor Flores lhe ensinou, ele partilhou comigo e eu resolvi revelar-vos...
Aliás aquela senhora disse-me um dia que o seu quintal em Matosinhos é o melhor remédio para curar maleitas. Garantiu-me que há-de pagar aos familiares e amigos uma festança, para festejar os 100 anos, em Itália e que o vinho vai ser Chianti...
Quem transporta no sorriso a sabedoria de uma vida, merece estas palavras de agradecimento pelo bem que fez, de forma tão simples e desinteressada.
Retribuo com uma paisagem da Toscânia, muito especial, porque é para ser imaginada.

quarta-feira, dezembro 01, 2004

O Pesadelo

Era impossível prolongar este susto de mentecaptos a decidirem o nosso futuro, este descambar que nos amargurava e envergonhava, tirava o sono e roubava os sonhos. Este mudar de opinião três vezes ao dia, a pose balofa de mensagem vazia.
O senhor Presidente da República, que num domingo de Outubro ignorei, quando na mesa ao lado tomava um café com o filho no Heynessis, nem como medida profilática deveria ter permitido que estes senhores se tivessem sentado na cadeira que grandes homens e mulheres "aqueceram"...
Aproveito para oferecer uma flor de luz- onde quer que esteja o seu espírito- a Lurdes Pintasilgo, portuguesa extraordinária, na qual votei para Presidente da República, que não resistiu ao riso alarve e grotesco dos carcereiros da harmonia.
Suspiremos de alívio então e empenhemo-nos para que o ar lavado se mantenha por muitos e bons anos, e que um ciclo de políticos competentes surja no horizonte próximo.
Para refazermos a caminhada sem avantesmas nem labregos, daqueles que são contra o aborto mas usam a metáfora dos bébés prematuros sufocados para exprimirem a sua pobreza mental.
Oxalá este tenha sido um decisivo golpe de misericórdia no bananal pantanoso em que isto estava a transformar-se...