Uma grande parte dos antropólogos da
geração de Eddy Nelson Chambino, que conheço, desempenha funções que os afastam
da investigação.
Eddy realiza com entusiasmo as suas
tarefas, continuando a recolher fragmentos etnográficos, de um todo de
experiências e memórias, que como Marc Augé assinalou vão sofrendo a erosão
parecida com as falésias, onde património e esquecimento, se mesclam, permitindo
olhares ficcionados.
Cioso do espaço de pertença Eddy Chambino
anota no seu caderno de campo vestígios, gestos sobreviventes afirmações
identitárias, ainda perceptíveis, complementando os inúmeros testemunhos e as
suas reflexões com apontamentos fotográficos de grande riqueza documental nos
desmedidos horizontes de Idanha-a-Nova.
Aquando da criação do Centro Cultural
Raiano, surgiu a primeira mostra, sobre um mundo em mudança, revisitando o
passado rural.
Eddy Nelson Chambino, enquanto cientista social,
contribuiu para prosseguir e aprofundar a recolha, sobre a região e a geografia
humana, indagando os ritmos da pastorícia, numa abordagem extensiva à produção
do queijo, á comensalidade, à lã e outros artefactos e ainda da criativa arte
pastoril. Os territórios da transumância e a diversidade de saberes dão
substância ao estudo “Pastores guardiões de uma paisagem”, que nasceu da
necessidade de acompanhar rebanhos e seus condutores, inventariando práticas e
hábitos.
Esta vivência, próxima da respiração da
terra, do saber empírico, em torno da impressionante tela da Natureza, entre
homens e animais, evidenciando ensinamentos transmitidos de geração em geração,
abrange a ocupação das horas menos activas, que atenuam excessos climatéricos e
uma enorme solidão, onde as “vozes” em redor são o vento, a chuva, os chocalhos
e um ou outro balido.
Orlando Ribeiro em “Portugal, o
Mediterrâneo e o Atlântico”, afirma que “no plaino do Alentejo e da Beira Baixa,
apascentadas em pousios e restolhos, há muito mais ovelhas que gente.” (p.
124).
“Pastores guardiões de uma paisagem”, é um
livro intenso, repleto de informação sistematizada, a partir dos depoimentos
dos protagonistas que são fontes primordiais para o autor, salvos do olvido
pelo magnífico trabalho de Eddy Nelson Chambino.
O fulgor da obra, cuja bibliografia de
cariz transfronteiriço realça a abrangência de cenários e actores, merece
degustação minuciosa, até porque a diminuta letra não permite leitores
apressados.
Nestas páginas de partilha ou na conversa
em terras de Idanha, aprendemos com Eddy a Arte Maior de entender o Outro e os
rituais quotidianos, reproduzindo costumes reconfigurados, que em “O Mundo na
Era da Globalização”, Giddens lembra tratar-se o tradicional de efabulação
recente.
Há livros que escutam o tempo.
“Pastores guardiões de uma paisagem”,
regista uma actividade secular, essencial para a economia dos lugares.
Pelo conteúdo e pela análise realizada,
Eddy Chambino não pode ser ignorado por quem pretende estudar territórios e
populações de cariz agrícola.
Bem hajas, Companheiro, por este olhar que
enriquece o conhecimento do que é ser andarilho nos campos onde se nasce universal
e português.
24-6-2019
Luís Filipe Maçarico
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