"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

sábado, março 29, 2014

O colossal inconseguimento



AVISO PRÉVIO
Avisam-se desde já todas as pessoas, com uma sensibilidade desmedida ou os desmedidamente fanáticos e/ou patrióticos, que hoje estou assanhado, politicamente incorrecto.

As associações de idosos, que conheço, estão exauridas e parecem-me sem imaginação. Mesmo que berrem muito e apareçam a querer distanciar-se das pré históricas. São na mesma neolíticas.
Se não promovem piquenicões, para darem largas à fome de justiça, ao som de acordéons, organizam lanches espirituais, para as elites envelhecidas, o que vai dar ao mesmo. Becos sem saída. 
Militares, polícias e outros profissionais, parecem estar a caminho de ser zombies. Já morreram e não sabem...
Certos intervenientes nas mil manifestações, continuam a aparecer com ursinhos de peluche. E antes do protesto acabar, cavalgam, a caminho do sofá e da pantufa, absorvendo a vitamina M, de merda, adormecendo a ver imagens de guerras, que é o que sucede a quem consome telejornais, manipulados por vampiros...
Quem salva a Pátria em saldo?
Talvez alguns mortos regressem, da sua zona de conforto, numa emigração cósmica, para assombrar os Palácios de S. Bento, Belém e Necessidades.
É preciso ter esperança: pode ser que algum ministro se borre, algum secretário de estado desista ou algum  engasgo fatal, durante pomposo banquete de estado, ou congestão inaudita, atinjam este ou aquele alvo da contestação.
Constata-se - e que ninguém ouse tapar o sol com a peneira - que existe um enorme, mega, colossal inconseguimento...
A propósito, apetece citar Alexandre O'Neill, num poema de 1965, tão actual:
PORTUGAL
 
Ó Portugal, se fosses só três sílabas,
linda vista para o mar,
Minho verde, Algarve de cal,
jerico rapando o espinhaço da terra,
surdo e miudinho,
moinho a braços com um vento
testarudo, mas embolado e, afinal, amigo,
se fosses só o sal, o sol, o sul,
o ladino pardal,
o manso boi coloquial,
a rechinante sardinha,
a desancada varina,
o plumitivo ladrilhado de lindos adjectivos,
a muda queixa amendoada
duns olhos pestanítidos,
se fosses só a cegarrega do estio, dos estilos,
o ferrugento cão asmático das praias,
o grilo engaiolado, a grila no lábio,
o calendário na parede, o emblema na lapela,
ó Portugal, se fosses só três sílabas
de plástico, que era mais barato!

        *

Doceiras de Amarante, barristas de Barcelos,
rendeiras de Viana, toureiros da Golegã,
não há “papo-de-anjo” que seja o meu derriço,
galo que cante a cores na minha prateleira,
alvura arrendada para o meu devaneio,
bandarilha que possa enfeitar-me o cachaço.

Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo,
golpe até ao osso, fome sem entretém,
perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes,
rocim engraxado,
feira cabisbaixa,
meu remorso,
meu remorso de todos nós . . . 
Alexandre O'Neill
texto, recolha do poema e fotografia: LFM

segunda-feira, março 10, 2014

NO AUTOCARRO ALCÂNTARA- RATO




 
Na paragem do autocarro, aguardava o 773, que me levaria, sete paragens depois, à Rua de Sant’Ana à Lapa, onde a minha correspondência fica retida – a meu pedido – após o encerramento do posto dos CTT das Necessidades, perto da residência, onde habito desde tenra idade…

Uma mulher cinzenta, com rabo de cavalo, sentou-se no banco da paragem, provocando com o cigarro que acendeu, a fuga de pessoas que também aguardavam o autocarro. Chegara depois de mim, mas mal o 773 apareceu, a mulher encostou a barriga junto à porta, para entrar.

Delicadamente, com a mão direita, avancei rente ao ventre da criatura e disse-lhe baixinho: “Peço desculpa, mas é por uma questão de respeito…estou primeiro!”
A saraivada de imprecações não se fez esperar e desabou sobre mim uma colecção de insultos, perante a passividade e conivência dos outros passageiros, o que me surpreendeu.

Aos berros, como se fosse uma matraca, bradou: “Estes filhos da puta destes velhos, andam à fossanga dos lugares…espero que morras primeiro de mim, que já estás a mais, e oxalá partas os cornos, quando saíres do autocarro!”

Então, limitei-me a comentar: “Vejo que a senhora é muito bem educada!”

Novo tsunami de impropérios: “Para falares comigo, tens de vestir saias!... olha-me para este, nem o meu marido, nem o meu pai!!! Vem uma pessoa cansada do trabalho e este gajo a chagar-me a cabeça…Deves levar porrada da tua mulher e vens marrar comigo…Estes bem vestidos têm a mania que o mundo é deles!”

Chafurdando no dislate, repisando, invertendo, comparando a minha atitude com a de alguns velhotes nos transportes públicos, que quase voam, como se não houvesse amanhã, para se apoderarem do melhor lugar, estava à vista de todos, na própria contradição da mulher, que abancara num lugar reservado para cidadãos com mobilidade reduzida: deficientes, velhos, grávidas…e ao longo do percurso entraram duas velhotas com mais de setenta anos e três mães com filhos pequenos.

Discretamente, chamei uma das idosas, convidando-a a ocupar o lugar vazio, ao meu lado.
À saída da mulher cinzenta, contei à senhora o que me sucedera e a reacção tranquila, foi curiosa:
“Não se enerve, sabe…as palavras têm retorno e tudo o que lhe foi desejado, vai cair em cima dela.”

Luís Filipe Maçarico (texto e fotografia)

domingo, março 02, 2014

Onde Comprar ou Ler livros de minha autoria

 

Hoje no Facebook, colocaram-me a questão: "Onde posso encontrar os teus livros?"
Sendo uma questão pertinente, confesso que nunca tinha sistematizado a informação, que é possível encontrar on line, surpreendente para o próprio autor... 
Vamos por partes.
Quem quiser comprar exemplares de livros meus pode tentar fazê-lo nos seguintes locais:

Na Livraria Municipal, ao lado da Versailles, na Avenida da República, 21 A, Lisboa, na Livraria Letra Livre, na Calçada do Combro,139; na Livraria Bulhosa (Campo Grande 10-B), e ainda pelo Alentejo, na Livraria Fonte de Letras (Évora), na Biblioteca José Saramago de Beja, Rua Luís de Camões, e ainda encontras no Museu da Ruralidade - núcleo da oralidade em Entradas (Castro Verde), no Campo Arqueológico de Mértola, R. Dr. António José de Almeida 1, e na Liga dos Amigos de Alpedrinha, Largo do Pelourinho (Fundão).



Quem pretenda consultar livros de minha autoria, ou livros de outros autores, com prefácios meus e ainda livros colectivos, antologias, onde há contributos da minha lavra, consoante a zona onde reside, pode procurar nos seguintes locas:

Biblioteca Nacional (estão disponíveis quase todos os livros que fiz) Bibliotecas Municipais de Lisboa, Centro de Documentação da antiga freguesia dos Prazeres, actual Centro Comunitário da Pampulha, R. Maestro António Taborda, Rede Nacional de Bibliotecas Públicas: Biblioteca Pública da Câmara Municipal do Porto, Bibliotecas Municipais de Viana do Castelo, da Póvoa de Varzim, de Santa Marta de Penaguião, de Santo Tirso, de Ovar, de Santa Maria da Feira, de Sever do Vouga, de Coimbra (tem imensos títulos), de Leiria, de Constância, do Seixal, Cascais, Centro de Documentação da Câmara Municipal de Évora, Bibliotecas Municipais de Castro Verde, Mértola, Faro, Silves e Loulé e ainda Biblioteca do Campo Arqueológico de Mértola e das Universidades do Algarve (UALG), Universidade Nova de Lisboa (UNL), Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE) e Biblioteca da Faculdade de Motricidade Humana...

Boas leituras!
Fotografias de LFM e caricatura de Isabel Aldinhas.

Vampirizados

Dei comigo, ao fim destes anos, a fazer contas - e a constatar, como o euro e as políticas seguidistas dos matarroanos que nos têm governado, reduziram aqueles que só têm o seu trabalho, e nenhumas posses (terras, heranças, poupanças), a um tremendo empobrecimento, que com a insistente austeridade, em breve ficarão na penúria...
Ainda hoje recusei, que um cobertor que me ofereceram, fosse para a lavandaria, cujo custo de limpeza dá para comprar um cobertor novo. Dez euros, ou seja dois mil escudos.
E depois, somos bombardeados com campanhas para poupança e reciclagem...Andam mesmo a gozar com o pagode!
Cada vez mais defendo a saída do euro, esse castelo em ruínas, onde reina um séquito de déspotas, dirigido pelo Fuher da actualidade, que dá pelo nome de Merkel.
As viagens que pude fazer no tempo - que agora dizem que foi uma ilusão - são difíceis de repetir, a não ser que não coma o essencial, nem pague as contas, cujo montante sobe cada mês que passa...E contudo, estar duas semanas na Tunísia, à minha maneira, em residenciais, comendo nos restaurantes populares, viajando em táxis colectivos, comprando apenas a viagem de ida e volta, custava-me o equivalente a uma semana aqui...por isso, não me atirem as Jonets e os Passos Coelho com areia para os olhos...
Mingua o salário, os cortes (do IRS à CES, que passou de 61€ para 178€) asfixiam a dignidade e os sonhos desmoronam-se deixando antever um futuro indesejável...
Eduardo Lourenço diz que fomos vampirizados. Eu digo que os portugueses já foram tão sugados, que se transformaram em zombies.
Em vários cantos do Mundo, a mesma seita inflingiu derrotas a povos e anseios.
Mãos estendidas, em saudação nazi, surgiram na Grécia, França, Ucrânia...
Não conheço outro caminho, senão lutar por um tempo respirável. Merecemos viver os melhores sonhos.

Luís Filipe Maçarico (texto e fotos)