Um dos valores patrimoniais de referência que Almada possui encontra nas “Cantadeiras de Essência Alentejana” a marca inigualável de uma tradição ciosamente salvaguardada.
São mulheres que vieram do sul, atraídas –
tal como os maridos – por uma vida mais compensadora.
Trouxeram a memória do vestuário que
usavam nas fainas do campo, costumes que são a sua pele, práticas que
enriqueceram a Alma (nunca traída), modas que as transportam no tempo para a
beleza da juventude, deixada para trás, não esquecendo nunca como era difícil
viver nesse sul de então, cercado de interditos, que alguns gostariam de
ressuscitar.
Após ano e meio de pandemia, superada
parte das dificuldades e impedimentos que inviabilizaram a aproximação, a
reunião, a actuação, apresentar um novo CD é o Milagre da Resistência deste
punhado de Mulheres Corajosas que permanecem, desafiando o Futuro com as suas
vozes acesas, incendiando com sílabas que são Clarões, o caminho de todos nós.
Escrevo estas palavras à luz de um
deslumbrante crepúsculo de Outono, grato pelo convite de poder participar em
tão empolgante evento, penso nos cambiantes musicais envolventes que o cante
delas emite, partilhando a generosidade e a alegria de se entrosarem de novo
diante de nós, assumindo o Amor à Terra.
Celebro os sorrisos e as lágrimas contidas
nas suas vozes de gente genuína.
Enquanto houver esta transmissão de
tradições, apenas a elas caberá, através do Encontro e na partilha – a defesa
das várias facetas da vida que enfrentaram no território identitário (tão
amado), onde aprenderam a respirar, saboreando o sol crú, os perfumes de um
chão sedento, ora seco ora florido, o pão e as iguarias, nem sempre acessíveis
a todos – o espantoso horizonte de asas e chilreios, a poesia passada de
geração em geração, e as pequenas grandes dores do quotidiano.
O Alentejo é muito mais que um texto ou um
livro bem intencionados.
O Alentejo é, acima de tudo, os gestos, a
fala, os passos destas Cantadeiras admiráveis, na sua vivência diária.
Fiéis aos lugares onde nasceram e onde
regressam, várias vezes, para limpar os olhos da Alma e poderem cantar com o
Coração a verdade intransmissível de tudo o que viveram e são.
Luís Filipe Maçarico