"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

domingo, maio 18, 2014

Estranha Celebração do Dia dos Museus no Museu de Arte Popular

Domingo dia 18 de Maio, Dia dos Museus, reentrei no Museu de Arte Popular.
Esperava-me o vazio, que já tomou de assalto o Museu da Aldeia da Luz. A receita é similar...

A exposição permanente foi desmontada e as peças arrecadadas (no caso do MAP, tornaram ao Museu Nacional de Etnolgia, que acolheu o seu património, quando uma Ministra de Sócrates, decidiu extinguir o MAP)...

Tal como no Museu da Aldeia da Luz,o único espaço (diminuto) tornou-se galeria de Arte Moderna, justificando a manutenção precária de um edifício, com tanta história controversa.
Está na moda, pelos vistos, esvaziar Museus polémicos, ocupando-os com exposições temporárias, o mais descontextualizadas possível.


Como no local da Aldeia da Luz destinado a guardar as memórias de um Povo, aqui também exarei um protesto, no sentido do espírito do lugar marcar, em relação ao futuro, a relação entre os artesãos de todo o país e todos os visitantes, jovens estudantes, ou velhos reformados.

Este Museu (chamado de Arte Popular) rebaptizado do Saber - Fazer e da Sabedoria dos Portugueses, que vivem no interior ou no litoral, de Norte a Sul, deveria ser a montra da Criatividade Popular.

Com uma introdução, do que foi inicialmente e do primeiro momento, em que existiu - Estado Novo - mas essencialmente com um novo olhar, acerca do que se faz, quer do que se continua a fazer, em nome de uma tradição identitária, quer dos novos usos patrimoniais, que os artesãos urbanos vão introduzindo, no quotidiano dos citadinos, tais como jóias e utensílios, com design reconfigurado aos tempos actuais.

Estranha forma esta, do Museu de Arte Popular, querer celebrar o Dia dos Museus, tratando-nos como se fôssemos burros... 

Desrespeitando os nossos melhores artífices, como o Dr. Manuel Freitas, do "Museu do Ouro", de Viana do Castelo, que estudou, inovou e revolucionou a ourivesaria minhota.
As criaturas apodrecidas dos gabinetes, que se pavoneiam no grotesco mundo pimba do poder, "não sabem nem sonham"...

Luís Filipe Maçarico (texto e fotos)

sábado, maio 17, 2014

Recuperar a Esperança

No domingo 25 de Maio de 2014, será dia para escolhermos os deputados, que nos representarão no Parlamento Europeu.
A Alemanha elege 96 deputados.
França, Inglaterra e Itália, elegem, cada um, 73 representantes.
Espanha elegerá 54 deputados. 
A Polónia, 51. 
A Roménia, 33. 
A Holanda, 26.
Com 22 representantes, cada um, Bélgica, República Checa, Grécia e Hungria.
Portugal escolhe 21 deputados, para nos repesentarem na Europa.
A Suécia, 20.
A Aústria, 19.
A Bulgária, 18.
Com 13 cada um, a Finlândia, a Dinamarca e a Eslováquia.
Com 12, cada um, seguem-se a Irlanda e a Lituânia.
Eslovénia e Letónia elegerão 8 deputados, cada um.
6 representantes, é o número que os pequenos países, como Chipre, Estónia, Luxemburgo e Malta, deverão escolher.

Ora, face a este panorama (751 deputados, no total dos 28 países, que constituem actualmente a UE), e conhecendo o que se passa na Alemanha, na França, na Itália, na Espanha, na Hungria, na Grécia, só para dar exemplos de governos de direita ou de pseudo-esquerda, que vão permitir eleger deputados extremistas, os deputados portugueses, pouco ou nada poderão mudar o peso dos países mais populosos, nas medidas que o Parlamento Europeu continuará a tomar, contra os países pequenos...

Resta dizer que a votação aqui, contribuirá para;

 - ou manter o estado de coisas, de perda continuada, para todos os que trabalham, para os que ficaram sem trabalho, para os que se aposentaram, para os que tentam manter as pequenas e médias empresas, de dimensão familiar, como restaurantes, cafés, minimercados, sapatarias, lojas de vestuário, ajudando a compensar os mais necessitados, da avalanche dos preços altíssimos, dos estabelecimentos de marca e da moda, de esplanadas de luxo, ligadas a alojamentos para turistas abonados (a Baixa de Lisboa está repleta deste tipo de hotéis, ditos de "charme", com dezenas e dezenas de sítios de comércio encerrados), que impede quem tem pouco dinheiro de fruir a cidade e os espaços tão envolventes que este país (ainda) possui...

- Ou mudar alguma coisa, através de eleições legislativas antecipadas, caso os actuais detentores do poder, que se julgam (ainda) maioritários após tanto desgaste e brutal austeridade, recebam o devido cartão vermelho à sua desastrosa governação.


 Dia 25 votarei CDU, para proporcionar o renascimento dos sonhos e de uma vida mais justa e igualitária, com o meu contributo, para que as grandes empresas, com lucros elefantisíacos e infames, em vez dos mais desfavorecidos, paguem as crises do Capitalismo.

A minha opinião, acerca do actual modelo europeu, é que deveríamos sair de uma associação, que tortura as pessoas e as impede de viver felizes, em constante insegurança, reduzindo o salário, os apoios sociais, a dignidade, a liberdade, a democracia. 
Assistimos a um arremedo grotesco dos valores humanos, somos tratados- países e povos - como lixo. 

Espero ainda ver em vida, a mudança, que restabeleça o equilíbrio e a harmonia, roubados pelos novos ditadores - os insaciáveis mercados. 
A esperança não morre, enquanto houver gente que diga Não e Lute por um Mundo Melhor.

Luís Filipe Maçarico

segunda-feira, maio 12, 2014

Memória e Olhares Etnográficos Sobre a Senhora da Saúde

Quando era miúdo, minha avó, mulher do povo, que viera muito nova, de Sant'Ana da Carnota (Alenquer) para Lisboa, a fim de servir famílias abastadas, levou-me à Procissão de Nossa Senhora da Saúde.
Nesse tempo, Gertrudes Thomaz vestiria a Senhora, que todos os anos muda de roupagem e assistiria à passagem do cortejo, numa varanda estratégica. Actualmente, Maria Silva cumpre esse devir.
Logo no início, circulava um camião de caixa aberta, de onde eram atirados molhes de rosmaninho. Hoje há mulheres a vender, nas imediações...

Era o tempo da Guerra Colonial e por isso, havia fuzileiros, paraquedistas, comandos.
Enfermeiras e médicos desfilavam e todas estas corporações, se misturavam com o enorme cordão humano dos participantes, trazendo emblemáticos arranjos florais, com menção da sua origem profissional.
Escuteiros e anjinhos, alunos do colégio militar, eram aos magotes.
Nos dias de hoje, o que aparece é uma representação residual. 

Na década de sessenta, a Mocidade Portuguesa Feminina surgia, ao pé da imagem da Senhora da Saúde, - havendo uma fotografia que documenta isso, na net - e a Legião Portuguesa, também marcava presença.
Havia muita gente a integrar-se atrás do pálio. E muita assistência.

Nos anos noventa, tornei a assistir à passagem da Procissão, na Rua do Benformoso, tal como hoje. 
E os meus "ouvidos de tísico" registaram comentários, de algumas mulheres, sem papas na língua, tal como aquela, que alto e bom som, afirmou: "Olha-me para aquele... já viste a "mala"que ele tem?" (a moradora referia-se aos genitais de um militar, que desfilava e teria atributos, que ela avaliou, olhando para a farda...)

Como em todas as cerimónias religiosas deste tipo, há um comércio de cariz sagrado, associado.
Vendem-se velas, medalhinhas, figuras da Senhora, em postal e em registos mais reduzidos, para colocar nos missais ou em sítios, onde ela proteja os crentes.

O Presidente da Câmara, qualquer que seja (e cheguei a ver Abecassis, Sampaio, Santana e agora Costa) integra-se, com o colar simbólico. Santo António antecede-o, levado pelos bombeiros.

São Jorge é o primeiro a aparecer, "descendo" do Castelo, até ao Martim Moniz, para seguir, sentado num cavalo, com a guarda montada da GNR - ou charanga, que passa o tempo a rufar tambores e executando hinos, apropriados ao contexto.

São Sebastião é insubstituível. Protector contra as pragas, junta-se à Senhora que, segundo reza a lenda terá protegido a capital do reino, da Peste Negra, sendo os derradeiros e principais protagonistas, com respectivas irmandades.
Todos os santos cujos andores são incorporados na iniciativa, são transportados por forças militares ou de segurança pública e acompanhados pelas bandas da arma destacada.

O evento realiza-se, segundo a "Breve Notícia Histórica sobre a Irmandade e Procissão de Nossa Senhora da Saúde e de S. Sebastião", folheto de oito páginas, sem indicação da autoria e data da execução gráfica, que se consumou no Entroncamento, desde 1570, sendo talvez a mais antiga do País e a maior de Lisboa.
Mas o fulgor religioso de outras eras, que Amália cantou em Fado (curiosamente esta tarde, a aparelhagem de som, junto à capelinha, partilhava uma interpretação da Diva, alusiva ao festejo, celebrando a Entidade Celestial, que reside há séculos na Mouraria), pode fazer jus à frase "A tradição já não é como era dantes"...

Na Rua do Benformoso existe um painel de azulejo, oferecido pela comunidade oriental residente, à Senhora da Saúde. A interculturalidade, patente na Mouraria dos nossos dias, evidencia-se, durante a procissão, fotografando da janela ou no passeio, misturando-se com o povo da cidade que acorre a esta Romaria ancestral. Milhares de pétalas chovem das varandas, engalanadas com colchas vistosas.

Percebe-se, observando os diversos momentose intervenientes, que, exceptuando a juventude dos militares, que por dever, foram escalados para a cerimónia, esta é uma festividade, essencialmente de velhos, que receberam, na sua prática de crentes, a herança de continuar a acompanhar o andor da homenageada.

São visíveis, as classes sociais, quer dos que ficam no passeio, impedidos pela polícia de entrar na função, quer dos que no cortejo pavoneiam uma pertença, que finge ignorar determinadas proclamações de Cristo, ostentando vestimentas, jóias e um espírito mundano, alheio a um olhar piedoso, sobre os que sofrem, porque "cada um é para o que nasce..."
Não foi por acaso que a procissão esteve interrompida entre 1910 e 1940 e entre 1974 e 1981...


Referências Bibliográficas:

Breve Notícia Histórica sobre a Irmandade e Procissão de Nossa Senhora da Saúde e de S. Sebastião", s/d

Documentos Electrónicos [ em linha ]:






quinta-feira, maio 08, 2014

Retrato de Entre Douro e Trás-os-Montes actual.


Reflexões Avulsas, com dedicatória (a António Cardoso, Paula Godinho e Shawn Parkhurst)

Penaguião não difere de Alpedrinha (Fundão), ou de Moreanes (Santana de Cambas, Mértola).
A peregrinação ao vinho ou à cerveja, é um ritual diário. Aqui mais de velhos - no "Escondidinho", onde há petiscos, no "Santa Marta". Os Reformados imperam.
Os jovens vão ao Cyber, aqui. Em Alpedrinha, vão à Pensão Clara, ao Cardeal...
A diferença, em Santa Marta de Penaguião, é que as mulheres não entram nos tascos, só nos cafés - e geralmente, em família.
Ao "Santa Marta", também vão romenos.
Os imigrantes chegaram do Leste. Mas igualmente do Brasil. No Museu do Douro (Régua), uma brasileira tenta falar português, escondendo o seu sotaque, depois de visitantes nacionais, do sexo feminino, a terem agredido verbalmente.
Na Régua, a população mais nova junta-se no restaurante "Limonete", para comer pizza.
A nível cultural, em Santa Marta, acontecem alguns eventos, na Biblioteca Municipal. Também há aulas de dança. Mas alguns jovens já partiram para longe e outros preparam-se para "desertar". A vinha não os alicia.
A agricultura biológica ainda é raridade. O sulfato continua o seu percurso.
Caldas de Moledo é uma ruína, abandonada há anos...
O interior está decadente.
As santas proliferam, sem graça, sem arte, dentro de vitrines por todas as povoações, contrastando com um ou outro santo de granito.
Uma onda de mau gosto na arte pública, de cariz religioso, reduziu a sua expressão ao equivalente das portas de alumínio, em relação às entradas de madeira. O feio abunda, rareia o belo.
Alastra a aberração.
Casarões e casarões permanecem desabitados, o ano (quase) todo.
Mansões de emigrantes sem uso, emergem na paisagem.
Chaves precisa de salvaguradar o património das ruas antigas. O casario envelhece, degrada-se.
Em Salsedas, o bairro medieval está interdito, corre o risco de cair.
Em Ucanha, uma menina desvenda "segredos" da torre-fortificação, na ponte-portagem. Mas diz que não tem tempo para aprender mais coisas, pois precisa de brincar.
A ponte românica de Tarouca podia ser valorizada, com um parque de lazer e recreio, à volta, Apenas erva e lixo, plásticos na água que continua a correr.
Em Vila Real, quarenta anos depois, o Padre Max foi evocado, com nome de rua.
Algures neste norte, um casal de idosos dexou-se burlar por ladrões de ouro. Curioso que continuam a dar "o ouro ao bandido", votando sempre naqueles que não lhes garantem um futuro sem sobressaltos.
Ao lado do Mosteiro de Salzedas (na parte privada), é possível visualizar uma criação de javalis, num enorme chafurdo, que um telão da sala de exposição de arte sacra esconde...
O povo dos baldios manifestou-se em Lisboa, recentemente. E os agricultores da Casa do Douro. Acompanhei-os.
Em Sanhoane, um daqueles palácios, que me lembram a época de Camilo, vai definhando na ampulheta do esquecimento.
Eternos, são os abismos, os socalcos, esta Primavera renovados. Por todo o lado, a azáfama do formigueiro humano; máquinas revolvem a terra, criando uma estranha paisagem em Abril, sem verdes...
Resistirão as abelhas, a tanta sulfatação?
E os pássaros, onde andam, que já não cantam, desde o "Sem Método", de João de Araújo Correia, salvo um ou outro melro perdido?
Haverá ainda pescadores? Não os vejo!!!
Os turistas banham o olhar no rio, nas encostas reflectidas, fruem o clima da "Ilha Mediterrânica", como chamou Orlando Ribeiro, a esta região...
Que sobrará da terra, quando os netos não quiserem saber do legado dos antepassados, e chineses e angolanos comprarem este território?

Luís Filipe Maçarico (texto e fotografias)
27-4-2014