Vila Franca de Xira foi o cenário, onde nasceu e se fez homem, o escritor Alves Redol.
Nas últimas duas semanas, visitei a cidade, percorri as ruas antigas, a borda d'água, e passei várias horas, de um sábado quente, na Biblioteca Municipal, consultando obras sobre e de Alves Redol, particularmente os livros de cariz etnográfico "Glória, Uma Aldeia do Ribatejo" e o "Cancioneiro do Ribatejo".
Para corresponder a um desafio, que se consumará em Novembro, na Universidade Nova, utilizei também um dia de férias, na Biblioteca do Museu do Neorealismo, acedendo ao espólio do autor de "Gaibéus" (cadernos de apontamentos, blocos de recolhas etno-linguísticas, fichas de leitura do romanceiro português e de inúmeros cancioneiros populares regionais, manuscritos, provas tipográficas, registos demográficos, textos originais de conferências etc).
No rescaldo desta recolha, retive algumas evidências...
Primeira constatação: Os estudiosos (geralmente historiadores) abordam o autor, relevando o cunho marxista e os contextos do neorealismo, referindo de forma apressada, quando referem, a riqueza de conteúdo, quer do indivíduo, quer dos bastidores da obra, pois tratando-se de um homem muito atento à realidade, muito ávido de conhecimento, preparava-se, documentando-se, a nível linguístico, visual, fazendo observação - participante, guardando nas suas notas, uma panóplia de dados, desde o vestuário e instrumentos de trabalho, aos versos cantados e ao movimento dos animais, com profundas descrições do território.
Os seus romances são de facto, como sua irmã Inocência afirmou "a Bíblia dos trabalhadores rurais", tendo alguns aprendido a ler, para poderem conhecer o retrato que Redol fez deles.
Os seus romances são de facto, como sua irmã Inocência afirmou "a Bíblia dos trabalhadores rurais", tendo alguns aprendido a ler, para poderem conhecer o retrato que Redol fez deles.
Segunda constatação: O cuidado, o rigor, da recolha e descrição de costumes e da criatividade popular, dos quotidianos das gentes do Ribatejo, que não se cinge à mera recolha local.
A leitura de Leite de Vasconcelos, Rodeney Gallop, Freud e as comparações, com o folclore das Astúrias e Galiza, revelam um homem empenhado, no conhecimento profundo do seu povo. E ainda mais do que isso, o visonarismo, antevendo a Globalização e a consequente necessidade de preservar o património identitário, mesmo aquele que sendo recente, acabará por ser património, amanhã.
A leitura de Leite de Vasconcelos, Rodeney Gallop, Freud e as comparações, com o folclore das Astúrias e Galiza, revelam um homem empenhado, no conhecimento profundo do seu povo. E ainda mais do que isso, o visonarismo, antevendo a Globalização e a consequente necessidade de preservar o património identitário, mesmo aquele que sendo recente, acabará por ser património, amanhã.
Alves Redol pelo seu percurso, de envolvimento, junto dos camponeses dos arrozais, no Ribatejo, ao lado dos Avieiros, ciganos do Tejo, como os definiu e, com quem habitou e pescou, além dos pescadores da Nazaré, em cuja comunidade viveu, para se documentar e falar a verdade, merece um olhar menos formatado, em que a escala é a do homem, que deseja conhecer o homem, ao longo do seu trajecto, na sociedade, através do tempo, para melhor compreender a possibilidade da sua transformação, num sentido positivo.
O seu ideal e a sua prática foram coerentes, e singulares, pois só em 1980, como Vítor Viçoso destaca, Saramago, com Levantado do Chão, utilizou a metodologia preparatória para o seu romance, residindo uma temporada no Lavre, ouvindo os camponeses, documentando-se sobre o Alentejo.
O espólio de Redol requer investigação aprofundada, face ao homem multifacetado, ser humano de grande riqueza espiritual, moral e cultural, que revela.
Efectivamente, um lutador de causas, ainda que o seu desempenho se dilua nos objectivos colectivos, é sempre o indivíduo particular, com um trajecto pessoal, que é muito mais que o mero militante do sonho, com todas as suas características e experiências, em busca de um lugar, para deixar a sua marca. Através da Literatura e de tudo o que leu e conheceu, para poder chegar a esse lugar de reconhecimento e partilha, Redol deixou um importante testemunho, sobre o tempo em que viveu.
Efectivamente, um lutador de causas, ainda que o seu desempenho se dilua nos objectivos colectivos, é sempre o indivíduo particular, com um trajecto pessoal, que é muito mais que o mero militante do sonho, com todas as suas características e experiências, em busca de um lugar, para deixar a sua marca. Através da Literatura e de tudo o que leu e conheceu, para poder chegar a esse lugar de reconhecimento e partilha, Redol deixou um importante testemunho, sobre o tempo em que viveu.
Luís Filipe Maçarico (texto e fotos)