"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

domingo, julho 09, 2017

Ildefonso Valério, um sublime encantador de palavras


Foi apresentado este sábado dia 8 de Julho de 2017, na "Fábrica das Palavras", Biblioteca Municipal de Vila Franca de Xira, com uma numerosa assistência, o livro "Ildefonso Valério Uma Vida com Teatro Dentro", idealizado por Ana Capucha, cujo espólio do companheiro (cartazes, fotografias, peças de teatro) foi partilhado na obra, onde colaborei, com outros amigos.
A mesa foi composta por Paulo Renato, Miguel Falcão, Luís Maçarico e o Presidente da autarquia, Alberto Mesquita, que falaram por esta ordem.
No final, um grupo de amadores de Teatro, que Ildefonso  Valério marcou com a sua sabedoria, fez uma leitura representada de "Santos Cacetes" (cuja acção decorre na época das lutas entre liberais e absolutistas).
Partilho, entretanto, o texto que li durante a sessão:

"Ildefonso Valério foi e é para mim um sublime encantador de palavras, que soube moldar com elas dramas e comédias, gizando desempenhos, provocando emoções, gargalhadas, reflexões.
Com ele aprendi, como o Vocábulo pode iluminar a pegada do Actor, muito mais que respirações e silêncios, sobre o palco, o qual, sem o Texto, não pode concretizar a Trama, e que sem esta não há Teatro.

Homem culto, sonhador de mundos novos, com seres livres de dependências, idealizou outro Portugal, em que a Palavra honrava quem dela fizesse projecto de vida. Artista ou Político, cada um devia seguir a caminhada mais motivadora, servindo a Comunidade.

A ele devo o ter deixado de ser o jovem tímido, que morava na Praça da Armada e varria as ruas da Lapa e da Madragoa, assegurando os papéis que me foram destinados, em representações que culminavam com debates, como daquela vez em que uma idosa aludiu a uma dessas actuações, concluindo “Hoje, o senhor fez-me pensar em como somos uns cães, uns para os outros!”. [eu fazia metaforicamente um cão de guarda, com casota de madeira, de um patrão sem escrúpulos].

Os personagens de Ildefonso Valério - encenados ou criados, pela sua sensibilidade, são o exemplo desse ideário, pelo qual deu a vida, escrevendo, lutando, realizando, gastando o tempo no seu laboratório de pesquisa humana (lendo inúmeras obras, que consolidaram a sua visão), esboçando vidas, como em “Histórias para Serem Contadas”, de Osvaldo Drágun, com desempenho brechtiano, retratando cenas da História, como nos seus “Santos Cacetes”, erguendo figuras populares, com sabedoria campesina, que ainda hoje são representadas por vários grupos de amadores de teatro, como é o caso de “O Pimpão”, também de sua autoria.

Dramaturgo premiado, encenador conceituado e adaptador de obras para Teatro, com Virgílio Martinho, e que ajudou a erguer espectáculos como “A Queda de um Anjo”, de Camilo Castelo Branco, representada por António Assunção, Ildefonso Valério animou dezenas de grupos, entre Alenquer e a capital [Sociedade de Instrução Guilherme Cossoul], tendo sido no concelho de Vila Franca de Xira que se dedicou ao afã de fundar associações, onde concebeu novos actores e um público fiel, que seguiram a pegada do criador.

Homem comprometido com o Progresso e o Futuro, intelectual envolvente, Ildefonso escreveu igualmente Poesia de grande qualidade, deliciando os que tiveram o privilégio de fruir a sua personalidade, acedendo ao que escrevia e reflectia.

O País deve-lhe muito, pela sua crença na Arte enquanto motor de transformação da Sociedade, que o levou a ter um papel importante, no enriquecimento cultural que partilhou ao longo do seu percurso, evidenciado num palco ou em textos que são o legado do seu pensamento e actuação. Permanece vivo este ser humano inquieto, cuja serenidade era a forma suprema para nos cativar, anunciando o mundo possível ao qual deveríamos dar o nosso melhor."

Luís Filipe Maçarico, Almada, 23-4-2017


3 comentários:

Paula Silva disse...

Sempre envolvente e generoso, sem deixar o rigor dos factos.
Obriga Luís, pela partilha.
Beijinho

Ginja disse...

Vindo da tua pessoa só pode ser um texto realista, à imagem da tua pessoa.
Texto que retrata a pessoa de Ildefonso Valerio como tu tiveste o prazer de conhecer.
Se duvidas houvessem de quem não conheceu o Valerio como é o meu caso, elas ficaram bem demostradas nas intervenções dos teus colegas de mesa.

Parabens Luís por mais este belo exemplo de vida e de pessoa que nos transmites.

Forte Abraço
Albano Ginja

Elvira Carvalho disse...

Gostei de ver.
Não conhecia.
Um abraço