Descreveu como ninguém a essência do seu bairro de infância - a Musgueira. Os textos foram publicados na revista da Aldraba.
Hoje faz anos. E a forma que encontrei de homenagear este irmão que a vida me deu, foi partilhar um pedaço da sua escrita:
PASSARINHEIRO
Senhor Alfredo, passarinheiro, de média estatura com umas bochechas rosadas das horas passadas ao vento e ao sol, na busca de um pássaro raro ou em apuros que pudesse acolher na sua gaiola gigante. Vestido de fato-macaco azul, quase sempre igual, em suspensórios, com bolsos grandes e abertos utilizados para guardar apetrechos do oficio e da paixão, ao qual tinha que estar sempre pronto, no caso de ser necessário fazer uma intervenção cirúrgica para salvar a vida de um passarinho. Não sei qual era a sua profissão, mas o amor que tinha pelos pássaros podia trabalhar no zoo. Tentava descobrir pelos utensílios, que levava e trazia do trabalho mas as suas botas pretas de biqueira de aço enganavam com excrementos de pássaro, parecendo mais tinta de caiar os muros.
Solteiro e muito bom homem dedicava mais tempo aos seus animais que à família e a si mesmo, por vezes perguntava-me, como seria a sua casa?
Será que tinha cama ou um ninho?
Será que tinha pratos para comer ou tigelas?
De certeza que não tinha banheira, para além de serem muito raras neste local também afogava os pássaros.
Tanto amor, dedicação, espaço e vontade de ocupar o tempo a tratar dos seus bichinhos evitando, talvez assim, pensar na pobreza e nas dificuldades. Não sei se o Sr. Alfredo conseguiria ser tão feliz com uma mulher, pois essa tirava-lhe algum do tempo que ele dedicava aos seus filhotes, não consigo velo de outra maneira, feliz e a cantar imitando os coloridos.
Seria eu também um especialista, se conseguisse falar de todas as raças de pássaros que ele tinha na traseira da sua casa, telhado, janela e até mesmo no interior, que mais parecia uma grande capoeira. Certo que tirava um pouco da estética ao bairro, já um pouco entrelaçado de cores, mas era bonito ouvi-los cantar e ver o sorriso dele ao tentar explicar e ensinar os mais curiosos, sobre uma ou outra melodia, cores de penas, bicos, machos e fêmeas.
O Sr. Alfredo tinha uma regra precisa e muito simples. Havia certos pássaros na sua gigante gaiola que nunca se iria desfazer deles, pois o cantar desses já tinha conquistado o lugar mais vazio da casa.
Era incrível como conseguia falar com eles, lógico que a resposta era sempre a cantar, talvez por isso, os problemas não existiam para ele.
Só um problema com os seus pássaros é que destronava a sua disposição, raramente vi-o chateado com o trabalho, mesmo não sabendo o que fazia, não posso esquecer a melodia dos seus pássaros assim como o seu grande sorriso.
Manuel José Graça da Silva
Fotografia de Ana Fonseca (também de parabéns pelo aniversário do seu maior tesouro - o Nuno Mathiotte, seu filho)
4 comentários:
Deste-mo a conhecer antes de fisicamente por palavras pelas quais mo foste descrevendo e às trocas de comunicação entre vocês.
Conheci-o há mais ou menos 6 anos através de ti e só o vi mais uma ou duas vezes mas ficou-me essa imagem de quem sonha e luta pela vida a que passou a dar mais e mais importância.
Mando-lhe por aqui um abraço grande e o meu desejo de que a vida se deixe construir à medida dos sonhos sonhados e da realidade que ele mais desejar, por eses sonhos.
Jingã para ti
... também um beijinho à Ana pelo aniversário do filho que não conheço mas que do que conheço dela será sim o seu maior tesouro...
Obrigada pelo beijinho de parabéns
que me foi dirigido.
ana
Ternura!!!!!!!
meu amigo sempre.
(imf)
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