Para lá de uma paisagem, com rio e pinhais, naquelas casas há uma gente rija, forjada nas agruras das inúmeras lutas, contra um regime que dificultou - durante décadas - a vida, aos que se manifestavam, contra a fome, a repressão, a falta de liberdade.
Olho para Custódia Marques, que chega de umas compras, e ela diz que ter estado presa, cinco anos, em Caxias, no tempo do fascismo, lhe deu força para enfrentar os problemas.
Que se não tivesse passado pelas dificuldades enfrentadas, seria igual aos que fazem escolhas eleitorais contra eles mesmos....
Olho para Joaquim José e ele diz - com um sorriso sábio e paciente - que estudou na prisão de Peniche, onde esteve onze anos. Que apesar de todo o mal, tentou extrair, como se fosse mineiro, o lado positivo, rumo a um futuro mais que merecido.
Um vento gélido contrasta com o céu azul, o sol que não chega a aquecer. Contradição, como aquela dos filhos dos que sofreram, terem partido,com a Democracia, para outras paragens, deixando a aldeia envelhecida a despovoar-se...
Nas fachadas das casas prolifera a narração, em azulejos diversos, que remete para tradições e patrimónios de uma identidade rural perdida...
À soleira das portas, os velhos estão mudos e quedos, rodeados por cães de olhar assustado, abandonados por famílias que emigraram de novo para as Suíças e Franças, do acolhimento que seus familiares, tiveram, a meio do século XIX.
Todos abandonados, entre o rio e a pequena elevação, para lá da qual fica o Alentejo, de onde vieram alguns avós.
No Couço, a solidão dói. Dezenas de casas e lojas estão desabitadas, à venda. Há um silêncio enorme, um desmedido vazio...
Todo o país interior é uma ferida aberta, que o desprezo dos governantes não deixa respirar.
Por isso, escutar estas pessoas, entre laranjais e fotografias dos seus ausentes, é perceber que Portugal está decadente e agoniza devagar...embora com palavras, que ainda têm o sabor da esperança...
Quando o carro deixa para trás o canito branco, procurando um dono, entre os idosos que fruem o sol da tarde, percebemos que os deixamos a todos, humanos e bichos, entregues a uma sorte, que é pouco luminosa. Aqui viveram e ficaram. Têm muita família sepultada no cemitério altaneiro.
E o rio Sorraia continua a correr.
A luta, desta vez, contra a falta de arranjo da ponte Joaquim Casanova do Beco, tempera o aço, de que são feitos estes resistentes. É a razão maior da sua existência.
Nasceram as primeiras papoilas...
Luís Filipe Maçarico
4 comentários:
Às vezes já nem os cães ladram, embora a caravana siga passando. Na passada, passado, passante, aquele abraço perdura, porém, abraÇalam literal, resistente, presente, pungente, entre o Sorraia e o Alentejo, entre a Pateira e o que não vejo.
Às vezes já nem os cães ladram, embora a caravana siga passando. Na passada, passado, passante, aquele abraço perdura, porém, abraÇalam literal, resistente, presente, pungente, entre o Sorraia e o Alentejo, entre a Pateira e o que não vejo.
Entre o Sorraia e o Alentejo, entre a Pateira e o que não vejo, aquele abraÇalam, que às vezes os cães não ladram mas a caravana segue passando e passante passa as passas dos Algarves, do Além ao Aquém, aqui e aqui, semper et ubique,,
Não consigo deixar de sentir uma enorme tristeza e a sensação de impotência perante as situações que em catadupa nos surgem aqui, além, como aí no Couço. Uma terra de gente sofrida, que lutou, sofreu prisões, e agora vê partir os jovens, sem esperança neste País, que não valoriza o saber, o empenho, os valores. Não é justo. Que contradição em terra chamada de Santa Justa!
Céu
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