"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

domingo, fevereiro 12, 2012

OLHO NOS OLHOS, ESTES VELHOS




Olho nos olhos, estes velhos
De faces rugosas e mãos
Deformadas de tanto trabalho
Escravo, à torreira de um
Sol castigador.

Olho nos olhos, estes sábios,
Dizendo admiráveis palavras
Que parecem fotografias
De um tempo de carência,
Relatando dias assombrosos
Pegadas indomáveis
De teimosa dignidade,
A resistência!

Olho nos olhos, estes camponeses
Do sul, sentados no largo da aldeia,
Ao postigo da casa ou comendo o cozido
De grão, falando como se fossem pássaros,
Do ar de liberdade que passou por aqui
E eles sonharam para sempre!

E ao olhá-los, sinto que pertenço
A esta luta, que também são minhas
Algumas pegadas, no pó dos caminhos da revolta.
Cada poema é uma bandeira de esperança,
À espera do dia desejado. E cada gesto, a certeza
Que estes homens e mulheres
Não fizeram a caminhada em vão…

4-6-2011

Luís Filipe Maçarico (poema incluído nas páginas 42 e 44 do Livro "Morada da Poesia, Poetas Celebram Manuel da Fonseca", edição da Câmara Municipal de Castro Verde, Novembro de 2011).
A fotografia dos desenhos de Manuel Passinhas, que ilustrou o livro referido, também é da autoria de LFM.
A fotografia com António Manuel, de Mértola, que me inspirou este poema, foi realizada pelo Amigo Ruas, do restaurante Tamuje. Em 7 de Maio de 2011 António Manuel tinha 92 anos e meio. Era um alentejano feliz porque tinha o cérebro em bom estado, cheio de lucidez... Nasceu na Amendoeira da Serra, tem 2 filhos, 6 netos, 6 bisnetos e 1 "tirineto"... "De vez em quando no Natal, na Páscoa e esses dias maiores, juntamos todos, fazemos uma festa!" Este é o Alentejo que me agrada. Da conversa, da memória e da identidade. Sem eles, a paisagem era apenas uma tela, vazia. Alentejanos, Poema Maior!

1 comentário:

Elvira Carvalho disse...

Meu pai se foi com 92 anos amigo. E era assim um homem lúcido e cheio de memórias.
Adorei o poema.
Um abraço e uma boa semana