"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

domingo, fevereiro 06, 2011

Um Milhão de Insubmissos?







Apareceu recentemente no Facebok, à boleia dos acontecimentos na África do Norte, um auto denominado movimento, que incentiva a reunião de um milhão de portugueses a manifestar-se, para correr com toda a classe política.
Provavelmente, enquanto comunista, daqui a pouco também quererão correr comigo, ou prender-me, ou torturar-me, pois embora nunca tendo sido deputado ou ministro, tenho opinião e sou contra este sistema podre que os portugueses originaram, escolhendo sempre os mesmos.
Concordo com António Filipe, deputado do PCP, que se pronunciou sobre esta iniciativa:
"Se temos a "classe política" que temos à frente do Governo é porque os portugueses votaram nela. Portanto, quem não está contente tem um bom remédio que é votar como deve ser: em vez de votarem nos mesmos de sempre, lutem, e votem em quem luta por um país melhor e mais justo.
Mais adiante, esclarece que "o povo egípcio luta para ter o direito a eleger democraticamente os seus governantes. Direito que os portugueses conquistaram em Abril de 1974, mas que aproveitam tão mal..." E depois faz a pergunta: "já agora, que "classe política" é que pretendem pôr no lugar da que está? Nenhuma, não é resposta." E antes de terminar, chama a atenção para o facto de "iniciativas inconsequentes e voluntaristas como esta só servem quem está no poder, porque prejudicam a luta por uma real alternativa."
De facto e numa altura em que certos sujeitos defendem a redução do número de deputados, justamente para penalizar os pequenos partidos e ampliar (mesmo que reduzindo o número) a influência dos dois partidos alternadeiros...esta reacção de alguns portugueses, que por arrastamento ( e desencanto) obteve adesões, parece-me servir gente como Merkel, Sarkozy e Sócrates, pois enquanto andarmos entretidos com folclore (a par dos outros éfes que faziam salivar o Salazarismo) estamos apenas a vaselinar o corpinho, cada vez mais dado ao manifesto, dos que de facto não têm respeito pelos direitos mais elementares, de quem ainda produz alguma coisa neste país, a começar pela paciência...
Nos nomes dos promotores da iniciativa vi apelidos com tamanho de comboio de mercadorias, não vi gente do povo, perdão, da sociedade civil, como agora é costume dizer-se... Vi gente boa atrás, decepcionada como eu, com este sistema iníquo.
A diferença é que eu acredito (há muitos anos) que é possível mudar.
Só que essa mudança tem de ser partilhada em maioria. No final de cada jornada eleitoral tenho recebido sempre murros no estômago, provavelmente de uma parte dos que agora querem ir para a rua, porque viram povos do dito terceiro mundo envergonhá-los, com coragem, com determinação e até com nível (exceptuando os serventuários e adeptos dos regimes decadentes contestados no Magrebe).

Caramba....Há um ano e picos votaram (ou abstiveram-se) novamente no Sócrates... Acabaram de votar no Cavaco (ou abstiveram-se uma vez mais)... E agora querem juntar 1 milhão na Avenida para imitar a revolta tunisina e egípcia?

Não julguem que gosto do que vejo e sinto!

Eu iria para a Avenida, se me dissessem que era para haver novas eleições e que esse milhão não votaria nos mesmos que nos (des)governam há 3 décadas, alternando-se...mas isso é o que tenho feito nas manifestações sindicais ao longo dos anos, muita vezes nessa emblemática Avenida da Liberdade...pois onde estavam estes cidadãos, paladinos da limpeza em relação à corrupção e ao fim do desemprego, quando eu sofri cortes no salário e me ameaçam com mais anos de trabalho e menos reforma, menos saúde, menos justiça, menos educação e um custo de vida insuportável? Tenho sentido a vossa falta de apoio (eu e os trabalhadores que se têm manifestado) ao ponto dos governos dizerem que somos sempre os mesmos e que a maior parte dos portugueses estão felizes?

Onde tem andado esse milhão de insubmissos?*

*Espero que não estivessem entre os milhares de descontraídos, que ontem, no Chiado, passeavam (também por lá passei e gosto de ver as ruas animadas, com vida, com gente), enquanto cerca de trinta portugueses (eu fui um deles) se manifestavam contra o que se passa no Egipto... Assim, qualquer um pode manifestar-se, pois avançar para a avenida e expôr-se , não ajuda a fazer a digestão... basta dar uma clicada, a dizer que sim, que irá e depois, fica em casa, pantufinhas calçadas, a jogar Farmville... Ah! Grandes Tugas!

Luís Filipe Maçarico (texto e fotografias)

2 comentários:

Marília Gonçalves disse...

ONDE ESTÁ,ONDE SE ESCONDE,ESSE MAGNÍFICO POVO DE ABRIL, QUE VEIO PARA AS RUAS EM 1974 E AS INUNDOU DE SEU APOIO DE SUA CONSCIÊNCIA,DE SEU CORAÇÃO?
QUE ESTRANHA LETARGIA É ESTA, QUE O NÃO DEIXA VER A BEIRA DO ABISMO SOBRE O QUAL SE DEBRUÇA?

DESPERTA POVO DE PORTUGAL! DESPERTA E POR FAVOR REJEITA O PERIGO QUE TE ESPREITA, QUE ENQUANTO DORMES CEGAMENTE TENS IRMÃOS QUE SE BATEM POR TI!
MERECE-OS! E DESPERTA!!

Marília Gonçalves

Sérgio O. Sá disse...

Cada vez mais em dia:

QUAL MEMÓRIA - OH PÁTRIA...

Estéril sentimento, sem raiz,
E uma massa informe, dita gente,
Percorre um chão de sonhos esmagados.

Qual memória - ho Pátria! - te desdiz?
Porque vais dando as mãos a quem te mente
E o teu amor a tantos renegados?

Traíram-te no leito em que eu te quis...
Roubaram-te a esperança e, de repente,
Os teus cravos murcharam, desfolhados!

S.O.S.
In Versos na Guerra - Versos de Paz