Há trinta anos tocou esporadicamente com Rão Kyao. Admite que Pedro Caldeira Cabral é uma referência na música medieval. Eduardo Ramos, animador de vários festivais e eventos que se referem ao imaginário islâmico e medieval, que actuou nos Jerónimos, num espectáculo de grande dignidade, promovido pela Embaixada do Egipto, esgotou com todo o mérito o pequeno auditório do Centro Cultural de Belém, no dia 17 de Janeiro de 2006, dia do seu próprio aniversário.
Em Silves, onde reside, dias antes deste concerto, promovido pela Antena 2, entrevistámos o artista, cujo coração está repartido pelo mundo.
A sua discografia é, aliás, testemunho dessa luminosa permanência, para lá da fronteira e do território de um Estado. A sua identidade é multifacetada: alentejano de origem, angolano por adopção, árabe por paixão, algarvio por habitação…
Vejamos como Eduardo Ramos sente as diversas vertentes, que ajudaram a formar a sua personalidade.
És músico desde quando?
-“Desde que nasci! Sempre me lembro de cantar! Quando era miúdo, ia à feira de Beja comprar uma gaita-de-beiços. Com quinze anos o meu pai ofereceu-me uma viola. Comecei a aprender viola. Com treze anos aprendi acordéon. Comecei a ser músico profissional aí a partir dos vinte e dois anos.”
Como é tocar ao lado do filho músico e da filha bailarina?
-“É um enlevo! (sorriso) É um prazer sem palavras, é um êxtase!
Qual a lembrança maior que guardas de Angola, onde passaste uma parte da tua vida?
-“Angola foi o país onde eu gostei muito de habitar. Onde aprendi muito, mesmo a nível musical. Em Angola tinha um grupo formado que se chamava “Os Windies”…
E que papel desempenha o Algarve no teu percurso humano e artístico?
-“O Algarve é a minha casa, é o meu lugar de retorno, quando venho das digressões.”
E o Alentejo?
-“É o festival islâmico de Mértola, aparte a pequena aldeola onde nasci e onde navegava naquelas planícies até aos 11 anos. Aqueles largos horizontes. A Fonte da minha aldeia é a Fonte das Cavadas. É uma fonte que parece um morábito.”
O que é um morábito?
-“Nos morábitos viviam os sábios sufis. Os chamados santos, marabouts, a quem as pessoas pediam conselhos e mezinhas. O marabout entrava em transe e dizia qual era o remédio que a pessoa devia tomar para se curar.”
Estamos a falar do tempo em que os árabes estiveram no sul de Portugal…porque é que a cultura árabe te motiva tanto?
-“Porque O Meu Coração é Árabe…O aprofundamento da cultura veio depois do grande amor pela poesia é música árabe. Foi uma paixão à primeira. Principalmente, a poesia. Conheço há muito tempo. O que me impressionou muito, além das poesias, foi o texto introdutório do Adalberto Alves. E eu disse: É mesmo isto que andava à procura… A música árabe estou a ouvi-la desde 1997.”
Das tuas viagens a Marrocos, que memórias te ficaram?
-“As pessoas e as paisagens. E depois o habitat. Foi aquele calor com que as pessoas me receberam. Quando diziam que português e nmarroquino é tudo a mesma coisa…”
O teu último disco é dedicado a Al Mutamid, autor dos poemas que cantas. Como é que esta figura milenar se envolveu nos teus dias, na tua arte?
-“Al Mutamid é um poeta de grande valor que nos toca profundamente…ainda depois para mais tendo nascido em Beja, e tendo vindo para Silves, praticamente o meu percurso…Há similitudes nas vidas, mudanças, caminhos…”
Tens certamente sonhos por realizar. Podes desvendar alguns, que gostarias de concretizar?
-“Ao nível musical, gravar um disco com música medieval, outro com música sefardita, outro de cantigas tradicionais portuguesas, tocadas ao alaúde e possivelmente juntar guitarra portuguesa. E outro com temas instrumentais, compostos por mim, gravados a solo, tocados ao alaúde. O grande sonho é divulgar mais a música que faço!”
Com muita tranquilidade, Eduardo Ramos foi respondendo às diversas questões. Depois, pegou no alaúde e encantou.
A música enleou-se nas cordas do instrumento e a sensibilidade e o virtuosismo transmutaram a noite fria. Os poemas cantados, de trovadores sábios, alguns dos quais também foram políticos de nomeada, antecedendo aqueles que se sentam nas cadeiras que eles “aqueceram”, pairaram entre as paredes da casa, assinaladas com vários testemunhos materiais dos lugares por onde andou, em peregrinação cultural.
Guardei as suas palavras, os cânticos, o som da vida dedilhada na voz de água do alaúde. O momento mágico, proporcionado por um grande artista, que é urgente conhecer melhor.
Lisboa, 17-1-2006
Luís Filipe Maçarico
NOTA FINAL APÓS O ESPECTÁCULO: Felizmente que a Antena 2 transmitiu este belíssimo espectáculo em directo. As televisões ignoram a beleza.Preferem sangue, futebol e novela...
Eduardo Ramos, Carolina, Baltazar e Tiago foram excepcionais e as centenas de espectadores que esgotaram a sala tiveram uma maravilhosa surpresa que passou pela dança extremamente bem executada pela jovem Carolina Ramos. Baltazar acompanhou o cantor, com um ritmo de suster a respiração, no tambor. Ana Fonseca dizia no final que ele a tinha conseguido transportar até aos dias em que viajou pelo deserto, na Tunísia. Eduardo Ramos e este grupo jovem e irrepreensível, de grande categoria, estão de parabéns.
Como era proibido fotografar a sessão, as fotografias correspondem, respectivamente a: 1-início da 1ª parte , aspecto do palco e do público. 2-José Manuel Gema, no início da 2ª parte. este amigo soube do evento por e-mail que reproduziu o post anteriormente dedicado ao assunto, o qual por sua vez, reenviou a outros amigos que também vieram. 3 e 4- Associados e dirigentes da Aldraba, no intervalo. 5-Os artistas, à saída do CCB (Baltazar, Eduardo, Tiago e Carolina).
Fotografias de LFM (perdoem as tremuras que foram de felicidade por tão belo encontro...)
NOTA FINAL APÓS O ESPECTÁCULO: Felizmente que a Antena 2 transmitiu este belíssimo espectáculo em directo. As televisões ignoram a beleza.Preferem sangue, futebol e novela...
Eduardo Ramos, Carolina, Baltazar e Tiago foram excepcionais e as centenas de espectadores que esgotaram a sala tiveram uma maravilhosa surpresa que passou pela dança extremamente bem executada pela jovem Carolina Ramos. Baltazar acompanhou o cantor, com um ritmo de suster a respiração, no tambor. Ana Fonseca dizia no final que ele a tinha conseguido transportar até aos dias em que viajou pelo deserto, na Tunísia. Eduardo Ramos e este grupo jovem e irrepreensível, de grande categoria, estão de parabéns.
Como era proibido fotografar a sessão, as fotografias correspondem, respectivamente a: 1-início da 1ª parte , aspecto do palco e do público. 2-José Manuel Gema, no início da 2ª parte. este amigo soube do evento por e-mail que reproduziu o post anteriormente dedicado ao assunto, o qual por sua vez, reenviou a outros amigos que também vieram. 3 e 4- Associados e dirigentes da Aldraba, no intervalo. 5-Os artistas, à saída do CCB (Baltazar, Eduardo, Tiago e Carolina).
Fotografias de LFM (perdoem as tremuras que foram de felicidade por tão belo encontro...)
4 comentários:
Porquê não promoves um conserto na Aldraba?
Um abraço. Augusto
Ouvi um pequeno pedaço do concerto de Eduardo Ramos e Ensemble Moçarabe no CCB, no dia 17-1-2006 e fiquei muito curioso e espantado.
Sou um amante da música e da cultura árabe, e sempre me perguntei aonde subsiste a música deixada pelos árabes no Al-Andalus, durante 7 ou 8 séculos. Ter-se-ia evaporado? Há dias encontrei num CD do Janita Salomé um poema musicado do Al Mutamid e foi um começo... Agora ouvi o Eduardo Ramos e fiquei mais esperançado. Afinal alguém explora a nossa cultura musical herdada dos irmãos árabes!
Já pesquisei na Internet o CD gravado pelo ER e Ensemble Moçárabe mas não há meio de obter informação. Será que alguém me poderá dar informações sobre o CD: etiqueta, pontos de venda, representante, o que seja. Antecipada e grandemente agradecido.
João Paulo Lopes
O meu email: jpfdlop@gmail.com
Tenho imensa pena, mas não pode ir...
Outras oportunidades virão.
Aquele ABRAÇO.
Caro Amigo João Paulo Lopes:
As minhas desculpas por só agora responder, porém só neste momento tive condições para reunir os dados, que gostosamente partilho consigo.
Muito obrigado pelo seu comentário no blog "águas do sul", a propósito de Eduardo Ramos e dos poetas árabes.
Para sua informação, o Eduardo Ramos gravou os seguintes CDs em que a música e os poetas árabes são apresentados:
ANDALUSINO, gravado nos estúdios InforArte, Lagos, 1999.
MOÇÁRABE, gravado no estúdio Musicália, Lagos, 2001.
AL-GHARB AL- ANDALUS - O OCIDENTE DO ANDALUS, gravado na capela do Convento de São Francisco, Mértola, nos dias 26, 27 e 30 de Abril, durante o Festival Islâmico, 2001.
CÂNTICO PARA AL MUTAMID, gravado nos estúdios InforArte, Lagos, 2005.
Há ainda um disco que recomendo, pela beleza da música e pela harmonia que estabelece com a poesia de João de Deus:
CAMPO DE FLORES, CAMPO DE AMORES, Homenagem a João de Deus no 1º Centenário da Morte do Poeta. 1996. Editado por EDISCO-Empresa Editora e Distribuidora de Discos, Lda. R. Dr. Alves da Veiga, 175. 4000 Porto T: 22564201 e 22560455. Fax: 22580349.
Aproveito para divulgar que no próximo dia 27 de Janeiro, na Biblioteca Municipal de Loulé, pelas 21h 30m, Eduardo Ramos cantará poemas de João de Deus.
Entretanto,dia 17 de Fevereiro pelas 18h e 45m, no Cine Teatro de São João, em Palmela, com Carolina e Baltazar, numa iniciativa do Grupo dos Amigos dos Castelos, de novo a música medieval, árabe, sefardita e cristã.
O contacto com o artista pode ser feito através dos seguintes nºs:
telefone: 282444685.
telemóvel: 965034764.
O endereço é:
Urbanização Silgarmar, 47
8300-051 Silves Gare.
Enviar um comentário