"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

sábado, dezembro 06, 2014

VISIONARISMO BRILHANTE




A semana passada, como tinha um encontro, marcado para a tarde de sábado, perto da igreja de Santo Condestável, e como a carreira 773 estava muito demorada, apanhei o 727 para o Rato, onde apanharia o 709, rumo ao meu destino. Só que no quadro electrónico, que anuncia o tempo que demora a chegar o autocarro pretendido, não constava o 709. Apenas me restou apanhar um táxi, para chegar a horas…
Isto fez-me lembrar o que me aconteceu uma vez, quando me desloquei à sede dos Amigos de Lisboa, para apresentar um power point, sobre o imaginário popular, em torno de Santo António. À saída (a meio da tarde) recusei boleia (bem parvo fui) e fiquei numa paragem da Av. de Berna, à espera do autocarro que passa nos dias úteis em Alcântara - Terra. Só que ele nunca passou, era sábado…

A capital, através do visionarismo brilhante, dos iluminados dirigentes da Carris, tem agora os bairros mais distantes entre si, graças à supressão de autocarros, que sábado à tarde, domingos e feriados deixam de circular, como o 709 (entre Campo de Ourique e os Restauradores) ou o 56 (entre a Junqueira e as Olaias).
Lisboa ficou ao nível das aldeias longínquas, esquecidas, do país real, desse país profundo, onde as vacas riem, como alguns asseguram ter visto.

Quem, nesta quadra, deseje sair da residência e pretenda ir ver as iluminações de Natal ou assistir a um espectáculo de revista no velho Parque Mayer, mas tenha mobilidade reduzida, por não possuir veículo próprio ou padecer de constrangimentos físicos, deverá prostrar-se frente ao televisor, pois não lhe restam grandes hipóteses de contacto com o mundo…

Os transportes públicos, como esta amostra exemplifica, existem para levar os trabalhadores de casa para o trabalho e vice- versa.
A possibilidade do desfrute da cultura e do lazer, não é admitida na mente dos responsáveis pelos transportes de Lisboa.
Assim, cada um deve ficar numa espécie de prisão domiciliária, nos dias de descanso. 
Se isto é uma democracia, vou ali e já venho…

Luís Filipe Maçarico ( texto e fotografia)