Ana Durão Machado, a autora do estudo
marcante “Feijó, Meu Lindo Feijó”, é um ser humano que se rege pela ética,
desempenhando com grande eficácia as suas investigações.
Antropóloga de formação, quando deu aulas
em Cercal do Alentejo, deixou um precioso rasto, publicando dois trabalhos
sobre antigas profissões locais: Barbeiros, Alfaiates e Costureiras,
descrevendo com minúcia e rigor os pormenores e testemunhos de cada um desses
ofícios.
Participou em inúmeros fóruns, partilhando
os seus conhecimentos, sempre em reformulação, privilegiando a qualidade da sua
observação-participante, cujas recolhas mereceram um tratamento quase
laboratorial, reflectindo e expondo as problemáticas, sugerindo propostas de
promoção para um património sobre o qual foi especializando o seu olhar,
actualizando contextos.
Saúdo particularmente na pessoa do
Professor Luís Palma, a União de freguesias que dirige, pelo apoio concedido à
edição deste livro.´
O acompanhamento assíduo do Grupo “Amigos
do Alentejo”, dos seus cantadores e familiares, a abordagem das diversas
vertentes que um colectivo tão rico oferecia, das profissões dos elementos à
vida familiar, as deslocações e respectivas actuações é evidenciado na sua tese
de Mestrado, ponto de partida para este estudo…
Participei em diversas iniciativas do
Grupo, então dirigido por Joaquim Afonso, e constatei o carinho a estima que
aqueles alentejanos dedicavam à autora, pois o seu respeito resultava também da
percepção da importância do seu trabalho, pelo retrato autêntico desta História
do Encontro e Criatividade de homens e mulheres que recriaram em Almada as suas
tradições, perpetuando a Identidade, trazida na alma e na pegada.
Enquadrando com bibliografia adequada,
fruto de uma pesquisa extensiva, a sua escrita clara, bem alicerçada, enquanto
cientista social atenta, neste livro, Ana Durão Machado procura chegar a um
público alargado, designadamente à geração do Cante na diáspora.
A sua dissertação que tive o privilégio de
ler, é a base da maioria destas páginas, que não perdem cientificidade por
serem mais acessíveis a leitores não académicos.
O mérito de “Feijó, Meu Lindo Feijó” é a
revisitação dos meses que a autora vivenciou, recolhendo o maior número de
vozes e dados, para construir a obra, que será sempre uma referência para quem
deseje abordar a caminhada do Cante fora do Alentejo.
O relacionamento social entre alentejanos,
ao estabelecerem-se na margem sul, o alojamento, o associativismo, a criação e
caracterização do Grupo Coral e Etnográfico, os conflitos e a importância do
colectivo, as prácticas festivas, as modas trazidas e criadas na nova morada e
os trajes, são alguns dos assuntos abordados.
Ao trabalho inicial, Ana Machado
acrescenta a revisitação, após duas décadas da recolha inicial.
Agora com 25 cantadores, ensaiando ainda
no Clube Recreativo do Feijó, o Grupo autonomizou-se, passando a ser uma
Associação apenas com 70 associados, recebendo 500 euros anuais de quotização,
o que limita a sua acção.
A doença, a morte e o envelhecimento dos
seus elementos, cuja maioria é de Serpa e Moura, influencia a evolução do
Grupo.
Todavia e como diz Ana Machado “o elemento
cultural performativo” que o Cante constitui, continua a ser uma prática de
busca da genuinidade das raízes.
“Os Amigos do Alentejo” continuam a atrair
os alentejanos da Área Metropolitana de Lisboa.
Contudo, os mais novos não reproduzem a
pertença dos migrantes antigos nem apreciam o Cante, pondo em causa a
sobrevivência desta tradição.
Por isso, este registo actualizado
eterniza décadas inesquecíveis de criatividade, amor à terra e união de gente
que partilha um valor maior: A Singular Identidade que agrega diferenças,
superando o Individualismo.
Parabéns, Ana Machado pelo teu contributo
em relação ao qual não encontro paralelo, pois é muito completo, prolongando-se
ao longo de mais de duas décadas, revisitando aquele colectivo, acrescentando
as alterações que o desgaste do tempo vai consumando…
É um grande prazer ler a tua escrita,
saborear a sabedoria que a honestidade dos teus textos contém.
Costumo dizer que os Antropólogos ficam
valorizados, quando um trabalho de excelência se apresenta para fruição da
Comunidade.
É o teu caso, por isso te agradeço a honra
que tenho em estar hoje ao teu lado.
Bem Hajas!
13-5-2021
Luís Filipe Maçarico (texto e fotografias)
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