"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

quinta-feira, maio 08, 2014

Retrato de Entre Douro e Trás-os-Montes actual.


Reflexões Avulsas, com dedicatória (a António Cardoso, Paula Godinho e Shawn Parkhurst)

Penaguião não difere de Alpedrinha (Fundão), ou de Moreanes (Santana de Cambas, Mértola).
A peregrinação ao vinho ou à cerveja, é um ritual diário. Aqui mais de velhos - no "Escondidinho", onde há petiscos, no "Santa Marta". Os Reformados imperam.
Os jovens vão ao Cyber, aqui. Em Alpedrinha, vão à Pensão Clara, ao Cardeal...
A diferença, em Santa Marta de Penaguião, é que as mulheres não entram nos tascos, só nos cafés - e geralmente, em família.
Ao "Santa Marta", também vão romenos.
Os imigrantes chegaram do Leste. Mas igualmente do Brasil. No Museu do Douro (Régua), uma brasileira tenta falar português, escondendo o seu sotaque, depois de visitantes nacionais, do sexo feminino, a terem agredido verbalmente.
Na Régua, a população mais nova junta-se no restaurante "Limonete", para comer pizza.
A nível cultural, em Santa Marta, acontecem alguns eventos, na Biblioteca Municipal. Também há aulas de dança. Mas alguns jovens já partiram para longe e outros preparam-se para "desertar". A vinha não os alicia.
A agricultura biológica ainda é raridade. O sulfato continua o seu percurso.
Caldas de Moledo é uma ruína, abandonada há anos...
O interior está decadente.
As santas proliferam, sem graça, sem arte, dentro de vitrines por todas as povoações, contrastando com um ou outro santo de granito.
Uma onda de mau gosto na arte pública, de cariz religioso, reduziu a sua expressão ao equivalente das portas de alumínio, em relação às entradas de madeira. O feio abunda, rareia o belo.
Alastra a aberração.
Casarões e casarões permanecem desabitados, o ano (quase) todo.
Mansões de emigrantes sem uso, emergem na paisagem.
Chaves precisa de salvaguradar o património das ruas antigas. O casario envelhece, degrada-se.
Em Salsedas, o bairro medieval está interdito, corre o risco de cair.
Em Ucanha, uma menina desvenda "segredos" da torre-fortificação, na ponte-portagem. Mas diz que não tem tempo para aprender mais coisas, pois precisa de brincar.
A ponte românica de Tarouca podia ser valorizada, com um parque de lazer e recreio, à volta, Apenas erva e lixo, plásticos na água que continua a correr.
Em Vila Real, quarenta anos depois, o Padre Max foi evocado, com nome de rua.
Algures neste norte, um casal de idosos dexou-se burlar por ladrões de ouro. Curioso que continuam a dar "o ouro ao bandido", votando sempre naqueles que não lhes garantem um futuro sem sobressaltos.
Ao lado do Mosteiro de Salzedas (na parte privada), é possível visualizar uma criação de javalis, num enorme chafurdo, que um telão da sala de exposição de arte sacra esconde...
O povo dos baldios manifestou-se em Lisboa, recentemente. E os agricultores da Casa do Douro. Acompanhei-os.
Em Sanhoane, um daqueles palácios, que me lembram a época de Camilo, vai definhando na ampulheta do esquecimento.
Eternos, são os abismos, os socalcos, esta Primavera renovados. Por todo o lado, a azáfama do formigueiro humano; máquinas revolvem a terra, criando uma estranha paisagem em Abril, sem verdes...
Resistirão as abelhas, a tanta sulfatação?
E os pássaros, onde andam, que já não cantam, desde o "Sem Método", de João de Araújo Correia, salvo um ou outro melro perdido?
Haverá ainda pescadores? Não os vejo!!!
Os turistas banham o olhar no rio, nas encostas reflectidas, fruem o clima da "Ilha Mediterrânica", como chamou Orlando Ribeiro, a esta região...
Que sobrará da terra, quando os netos não quiserem saber do legado dos antepassados, e chineses e angolanos comprarem este território?

Luís Filipe Maçarico (texto e fotografias)
27-4-2014




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